São Paulo, segunda-feira, 2 de dezembro de 1996
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Xixi nas calças

RUI NOGUEIRA

Brasília - Não há nada mais produtivo em um debate do que uma pergunta certa na hora certa. Debate encruado é esse sobre o futuro do jornal impresso que começa com a pergunta (errada): "Quanto tempo os jornais impressos ainda sobreviverão às novas tecnologias?". E daí?
Ninguém questiona por quanto tempo mais ainda vamos usar a roda. E tudo indica que as facilidades de manuseio oferecidas por jornais e livros lhes darão uma longa sobrevida.
A verdadeira ameaça à imprensa vem de outro lugar -da massa de iletrados que as escolas e a sociedade não conseguem educar. Basta refrescar a memória com a pesquisa de avaliação do ensino divulgada na semana passada pelo MEC -apenas 1% dos alunos do 3º ano do 2º grau responderam corretamente às questões de português. O percentual, repito, foi de 1%.
Também na semana passada, um jornalista dinamarquês jogou luz sobre o assunto. O futuro do jornal, disse Jens Linde, presidente da Federação Internacional dos Jornalistas, está no trabalho junto ao público das escolas e no investimento na qualidade da informação. A idéia é não perder o leitor que realmente lê o jornal.
É que, entre os compradores de jornal, muitos não o lêem. Nada demais nisso, porque um bom jornal é produto de mil e uma utilidades. Inclusive, pura e simplesmente, embrulhar peixe ou forrar a gaiola do passarinho.
Perigoso é fazer do leitor que prefere um brinde a uma reportagem bem escrita o móbil do crescimento. Linde comparou essa estratégia oportunista ao recurso de fazer xixi nas calças para esquentar as pernas. Enquanto a urina escorrer, tudo bem. Depois, as pernas, molhadas, esfriam.
Como os jornais mostram um bom desempenho na arte de se adaptar aos novos tempos, a pergunta certa, para o momento certo, é: será que estamos produzindo reportagens bem escritas, bem apuradas e de interesse público? Algumas edições não parecem ter menos informação do que a televisão mostrou no dia anterior?

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