São Paulo, segunda-feira, 2 de dezembro de 1996
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A media luz

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Os entusiastas da reeleição, sobretudo na mídia, aos poucos desencavaram um argumento devastador: não é justo, depois de 21 anos de cassações, exílios e torturas, direcionar justamente contra o presidente da República esse arsenal autoritário. Não se pode cassar FHC do sagrado direito de ser candidato a um cargo eletivo. Nem condená-lo a um exílio que, no passado, ele mesmo se condenou, para esperar nova onda que o surfasse à praia.
Como todo e qualquer cidadão brasileiro no uso de seus direitos civis, FHC pode ser candidato. Será uma violência abominável, uma truculência moral excluí-lo da próxima eleição.
Acontece que quem se excluiu (como quem voluntariamente se exilou) foi o próprio FHC. Ao tomar posse de um mandato que ele e todos sabiam que era de quatro anos, jurou solenemente perante a nação cumprir e fazer cumprir a Constituição.
Bem, se é assim, mude-se a Constituição. Ela não pode ser um entrave ao progresso e à felicidade do país. Foi assim que todos os tiranos e ditadores fizeram ao longo da história, apoiados geralmente por baionetas, tanques e canhões, que estão meio desmoralizados.
Muda-se a Constituição com mais facilidade a custa de barganhas legislativas e pressões econômicas. Nesse ponto, a mídia é eficiente cabo eleitoral para amaciar os renitentes e convencer os indecisos.
Liberte-se FHC do autoritarismo da Constituição que lhe cassa o direito de ser novamente candidato. Se amanhã, Maluf, Lula ou qualquer outro chegar à Presidência, então que se mude novamente a Constituição, reduzindo-lhes o mandato.
Fazendo da Lei Magna um puxa-puxa, uma goma de mascar, sabor abacaxi, o Brasil estará seguindo o edificante exemplo da Argentina e poderá dançar o seu primeiro tango: "a media luz".

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