São Paulo, quinta-feira, 5 de dezembro de 1996 |
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Diretor japonês chega com Shakespeare multimídia
FERNANDO OLIVA
Os seios à mostra e os malabarismos circenses de Rosset não têm nada a ver com a versão multimídia de "Otelo" que estréia neste sábado no Sesc Ipiranga. Mas só o fato dos personagens de Otelo e Iago serem interpretados por dez atores diferentes -ou o palco receber projeções de vídeo- já é motivo suficiente para fazer tremer qualquer purista da dramaturgia shakespeariana. A clássica tragédia de amor, traição, ciúme e morte chega à cidade -depois de passar por Tóquio (Japão) e Lima (Peru)- pelas mãos do diretor japonês Hideki Hayashi, 42, responsável pela companhia Terra Arts Factory. O grupo foi criado há três anos por Hayashi e busca a fusão das técnicas tradicionais do teatro japonês, como o nô e o cabúqui, com a arte contemporânea. Pela primeira vez no Brasil, o grupo já se apresentou na Croácia, Eslovênia, Bangladesh, Alemanha, Venezuela e Peru. A história de Otelo, o mouro que, vítima das intrigas de seu conselheiro Iago e dominado pelo ciúme, mata sua mulher Desdêmona foi totalmente transfigurada pela versão multimídia de Hayashi, batizada "Desdêmona". Se na história original de 1604 a peça começa a terminar com o assassinato da nobre Desdêmona, a versão de Hayashi inicia-se com a volta do espírito de Desdêmona do inferno para atormentar Otelo. Os elementos teatrais são associados à projeção de vídeos e à dança. Em entrevista à Folha, Hayashi disse não haver contradição no uso de imagens eletrônicas e dança num texto clássico de Shakespeare. "A mistura de diferentes manifestações artísticas está na formação da cultura japonesa. Vem sendo assim por milhares de anos, e a dramaturgia dos teatros nô, desde o século 13, e cabúqui, a partir do 17, sempre uniu a dança ao teatro. A idéia de relacionar elementos é muito antiga nas artes japonesas." Outra "heresia" do diretor é deslocar o foco da peça. Se Shakespeare trabalha traição, poder, ciúme e amor, a trama concebida por Hayashi investe no "complexo de inferioridade de Otelo e Iago". Segundo ele, o ciúme doentio e a dúvida de Otelo sobre a fidelidade de Desdêmona são explicados pelo complexo de inferioridade do mouro em relação à mulher. Uma segunda relação de inferioridade, desta vez por parte de Iago, também contribui para o final trágico. "Há uma relação muito profunda entre ciúme e complexo de inferioridade", afirma Hayashi. "Otelo é um espelho de Iago e vice-versa. O branco reflete o preto e, por vezes, é o preto que reflete o branco. O que me interessa é esta inversão: o bem está representado pelo personagem negro, Otelo, e o mal reside em Iago, branco." Peça: Desdêmona Direção: Hideki Hayashi Com: Companhia Terra Arts Factory Onde: Teatro do Sesc Ipiranga (r. Bom Pastor, 822, tel. 011/273-1633) Quando: sábado (21h) e domingo (20h) Quanto: de R$ 3 a R$ 6 Texto Anterior: Oito peças encerram temporada domingo Próximo Texto: Portuguesa ataca em massa e retranca em bolo! Índice |
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