São Paulo, sábado, 7 de dezembro de 1996 |
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Arantes decifra ABC da miséria nacional
FERNANDO DE BARROS E SILVA
O lançamento ocorre na Livraria Livre, onde o autor também estará autografando "O Fio da Meada - uma Conversa e Quatro Entrevistas sobre Filosofia e Vida Nacional", lançado há dois meses. A noite de autógrafos em dose dupla não se deve a uma estratégia da editora, a Paz e Terra, para aliviar seu estoque de Natal. Tampouco é uma jogada do autor que, vendendo gato por lebre, estaria empurrando de contrabando ao incauto um livro que trata da comédia ideológica brasileira junto com o outro, sobre a insuspeita filosofia do idealismo alemão. Nada disso. Os livros são na verdade complementares e, mais do que isso, "O Fio da Meada" foi concebido originalmente como um simples posfácio ao "Ressentimento da Dialética". Posfácio feito em forma de conversa do autor com três colegas, conversa que desandou, saiu dos trilhos e acabou tratando um pouco de tudo. Se quisesse nos facilitar a vida, Arantes poderia batizar o fio da meada que desenrola de "ABC da miséria brasileira". E aqui já esbarramos naquele que é o verdadeiro assunto do autor há pelo menos 20 anos, desde que publicou em 1975 um pequeno ensaio na revista "Almanaque" intitulado "Idéia e Ideologia". Mas, afinal, do que se trata? A resposta não é fácil. Diante da variedade de assuntos que o autor mobiliza, da origem da dialética hegeliana à formação da filosofia uspiana, da experiência da dialética em Antonio Candido e Roberto Schwarz à crítica da ideologia francesa, sempre numa prosa desenvolta e cerrada, que passa de uma área do saber a outra de forma pouco acadêmica, o efeito da obra de Arantes é desconcertante. Bento Prado, que desde cedo foi capaz de decifrar as pretensões de seu "primeiro aluno", escreve que "identificar a perspectiva de Paulo Arantes é identificar seu alvo e este não é outro senão a crítica da filosofia contemporânea (diagnóstico do nosso mal-estar) na sua dispersão estilística e geo-nacional (...). Na sua dispersão, mas também na sua coesão escondida, articulada pelo nexo do desenvolvimento desigual e combinado na figura contemporânea do Capital". Tarefa, portanto, materialista, cuja primeira inspiração é a crítica que Marx fazia aos chamados hegelianos de esquerda, na década de 40, mas devidamente instruída pela descoberta que o mesmo Marx faria 20 anos mais tarde, segundo a qual a história moderna se realiza à revelia e pelas costas de seus sujeitos. Ou seja, o verdadeiro sujeito da história, "sujeito automático", "sujeito fantasma", é o "capital". Os dois livros de Arantes equacionam o mal-estar do intelectual no mundo contemporâneo. No caso dos alemães, tratava-se de "organizar o niilismo". E hoje? Com a palavra o autor: "O que nos fará pensar, além, é claro, do primeiro degrau representado pelo processo de desintegração nacional? Alguém já observou que toda vez que a referência nacional entra em baixa, a vida intelectual resvala para a irrelevância. Aliás, quem cuida profissionalmente de filosofia no Brasil sabe muito bem disso". Livros: Ressentimento da Dialética - Dialética e Experiência Intelectual em Hegel (Antigos Estudos sobre o ABC da Miséria Alemã), 413 págs.; Fio da Meada, 328 págs. Lançamento: terça (10), às 19h Onde: Livraria Livre (r. Armando Penteado, 44, Higienópolis, região central) Preços: R$ 29 e R$ 24, respectivamente Texto Anterior: Antonio Cicero exibe seu "Guardar" Próximo Texto: Obras traçam perfil da realidade negra Índice |
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