São Paulo, segunda-feira, 9 de dezembro de 1996
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O LEGADO CONCRETISTA

No mundo das artes, como em política e economia, as transformações não se fazem por pura e simples ruptura com a tradição. Esse parece ser um dos pontos de convergência entre depoimentos de críticos, poetas e teóricos ligados ou não ao concretismo, tendo em vista a comemoração dos 40 anos do surgimento dessa importante vertente estética no cenário artístico brasileiro.
Como todo movimento que busca definir claramente uma identidade própria, os concretistas tiveram de realizar calorosos confrontos com os representantes de tendências estéticas anteriores. Seu projeto histórico consistia em superar formas discursivas tradicionais de criação literária, rompendo com o ordenamento sintático habitual dos textos poéticos e explorando ao máximo os aspectos gráficos e fônicos das palavras, numa ousada aproximação entre literatura, artes plásticas e música.
Apesar da postura transgressiva de seus criadores, é praticamente impossível desvincular essa inovação literária dos movimentos de vanguarda artística européia do início do século 20, bem como dos simbolistas franceses do século passado.
E, mesmo que um de seus idealizadores, Décio Pignatari, admita que "no Brasil as idéias envelhecem mais rápido que as pessoas", não se pode negar que os experimentos estéticos dos concretistas mostravam uma aguda sintonia com o avanço tecnológico no Ocidente e mesmo a realidade brasileira da época, marcada por um espírito de modernidade e desenvolvimentismo. O movimento encontra aí parte de sua atualidade, tendo inclusive exercido forte influência sobre a publicidade.
Mais do que fruto de "inspiração", a obra literária, a partir dos concretistas, passou a ser, para muitos, resultado de uma relação artesanal com o texto (o que talvez explique a dedicação de alguns de seus principais poetas ao ofício da tradução).
Seria ingênuo esperar que o concretismo se tornasse uma corrente hegemônica num mundo em que tudo tende a ser cada vez mais perecível. Mas, mesmo na captação sensível do que perece, pode-se dizer que os concretistas foram bem-sucedidos.

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