São Paulo, domingo, 15 de dezembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Estabilidade de preços faz o Brasil 'reviver' os anos 50

Taxa deve ser de um dígito, a menor desde 57

ANTONIO CARLOS SEIDL
DA REPORTAGEM LOCAL

Ano de 1957: construção de Brasília, JK, aliança PSD e PTB, candangos, carros nacionais, DKW, bossa nova, Luz del Fuego, Angela Maria, Juca Chaves.
Ano de 1996: privatização, FHC, aliança PSDB e PFL, sem-terra, carros importados, Corsa, Taís Araújo , Chico César, É o Tchan.
O que dois anos tão distantes no tempo e diferentes em seus ícones têm em comum?
A resposta, inflação baixa.
Segundo o estudo "Séries Históricas - Inflação", da Andima (Associação Nacional das Instituições do Mercado Aberto), que usou o IGP-DI da Fundação Getúlio Vargas para comparar a inflação desde o Império até Itamar Franco, a taxa de inflação em 1957 foi de 7%.
Surge Pelé
Naquele ano da segunda metade dos anos 50, o presidente Juscelino Kubitschek lançava a pedra fundamental da construção de Brasília, a "meta-síntese" de seu Plano de Metas para o país crescer "cinquenta anos em cinco".
Em 1957, um menino de 16 anos, conhecido pelo estranho apelido de Pelé, integrava a seleção canarinho de futebol pela primeira vez, fazendo o gol de honra do Brasil na derrota de 2 a 1 para a Argentina, no dia 10 de julho no Maracanã.
Chegava às livrarias uma obra-prima da literatura brasileira: "Sobrados e Mocambos", de Gilberto Freire.
E os consumidores deslumbravam-se com a abertura dos primeiros supermercados. Supermercados, que nos últimos quarenta anos, foram testemunhas do espectro inflacionário no país.
Abertura
Juarez Rizzieri, presidente da Fipe-USP (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo), um dos maiores estudiosos da inflação no país, atribui à abertura da economia a inflação mais baixa desde JK.
Se este ano o país terá, possivelmente, seu primeiro Natal de inflação de um dígito nos últimos 39 anos, com produtos de todo o mundo nas prateleiras dos supermercados, foi justamente a economia fechada a principal responsável pelo surto inflacionário depois de 1957.
Com seu Plano de Metas, que prometia ao país crescer "cinquenta anos em cinco", JK lançou um programa desenvolvimentista cuja finalidade era modernizar o Brasil, dotando-o de indústrias de base e de bens de consumo duráveis, como automóveis.
O Plano de Metas teve como um de seus pontos centrais a atração de recursos estrangeiros, promovendo a importação de capitais, indústrias e tecnologia.
A indústria automobilística, principal alicerce da construção do parque industrial, cresceu exponencialmente, passando da produção de 30.542 unidades, em 1957, para 133.041, em 1960.
Os marcos da indústria nacional dessa época são a Rural Willys, a Vemaguet, o DKW, o "Fusca", o Dauphine, o FNM-JK, o Simca Chambord e o Aero Willys.
Contrastes
Mas ao contrário do Plano Real de FHC, o Plano de Metas de JK previa o fechamento da economia por meio de altas tarifas aduaneiras para forjar a implantação de um parque industrial no país.
Rizzieri vê nítidos contrastes entre os fundamentos macroeconômicos por trás das baixas taxas de inflação de 1957 e 1996.
Em primeiro lugar, diz, a característica da década de 50 foi um enorme ritmo de crescimento durante o governo de JK. A inflação baixa foi acompanhada de uma explosão de crescimento.
A inflação é parecida, mas o nível de atividade é diferente. Hoje, a economia cresce a 3%. Na segunda metade dos anos 50, crescia a taxas entre 5% e 7%, na média.
"Naquela época, a política era de estímulo à produção interna, agora está estimulando o consumo de produção externa", diz.
"São ênfases diferentes, porque a política econômica dos anos 50 privou a competição de fora com as tarifas, a política econômica de agora está estimulando a competição de fora para aumentar a produtividade."
Segundo Rizzieri, a euforia do desenvolvimento de JK geminou a inflação. A taxa subiu para 24%, em 1958 e chegou a 40%, em 1959, caindo para 30% em 1960. "A orientação de política econômica é diferente: industrialização a qualquer custo versus competição e estabilidade a qualquer custo".
Mais fôlego
Rizzieri acha que a curto prazo os requisitos para a manutenção do programa anti-inflacionário de FHC são sustentáveis.
Para ele, há duas ameaças a essa política: o crescimento acelerado das importações e o consequente desequilíbrio das contas externas. Rizzieri não vê, porém, riscos a curto prazo. Estão entrando recursos externos para investimentos e o volume das reservas é alto, mas tem dúvidas a longo prazo.
"Na medida em que as reformas forem andando, e o país conseguir reduzir o custo Brasil, a política econômica terá mais fôlego."

Texto Anterior: Relator quer mudar data da eleição
Próximo Texto: FHC estudava questões raciais
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.