São Paulo, domingo, 15 de dezembro de 1996
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Tempos modernos

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

No baú das mitologias do século 20, a década de 50 cintila com seu tesouro de ícones do conforto doméstico e da vida moderna. Os "fifties" são a cara da América, a potência do fim do milênio. São os anos da grama bacana, da torradeira, do sundae, do topete, do rock, das lanchonetes, do neon, dos carrões e de uma alegre e colorida Hollywood.
Mas também aqui no Brasil a década foi especial. Os 50 sepultaram o getulismo e viram brotar o sorridente desenvolvimentismo de JK, que estufou as velas do otimismo nacional.
O sonho brasileiro teceu, naquele período, as fantasias para a consolidação de uma imagem moderna do país: bossa nova, cinema novo, poesia concreta e a nova capital... Um Brasil inteligente imbuiu-se, radiante, do espírito do novo.
O ano de 57 marcou a estréia de Pelé na seleção e viu Maria Esther Bueno vencer o célebre torneio de Wimbledon, na Inglaterra.
No teatro, Nelson Rodrigues anunciava sua estréia como ator, no Municipal do Rio, em "Perdoa-me por me Traíres". "De 19 a 29 de junho, viveremos dez dias de loucura. Mas eu vos digo: o teatro brasileiro há de se fazer com possessos", escreveu o autor, que fez o personagem Tio Raul.
Nas telas, o hoje cultuado "O Homem do Sputnik", com uma escultural Norma Bengell e o impagável Oscarito, mantinha viva a chanchada. Mas outros filmes, como "Rio Zona Norte", de Nélson Pereira dos Santos, anunciavam o ciclo de um novo cinema.
No país da bossa nova, 57 foi também um ano de bom jazz. Aqui esteve, no Ibirapuera, em São Paulo, o legendário Louis Armstrong, acompanhado por uma das vozes mais queridas do Brasil, a de Ângela Maria.
Foram anos que a história guardou com certa alegria, depois da destruição causada pela Segunda Guerra. Mas foram também anos de tensão.
O Brasil deixou a alegria quase ingênua da década para entrar num conturbado período de autoritarismo.
Em 94, FHC lançou-se como uma espécie de segunda edição de JK. Ainda precisa virar nome de carro e ser tema de música para chegar perto.
Conseguiu, de qualquer modo, a inflação de um dígito. O que não nos recoloca naquele paraíso perdido na memória, mas certamente nos afasta do inferno da década perdida.
O que não é pouco.

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