São Paulo, sexta-feira, 20 de dezembro de 1996 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
'Em seu olhar ele já estava muito longe'
LUIZ ANTÔNIO RYFF
Entre esses filmes estão alguns clássicos como "A Noite", de Michelangelo Antonioni, "Ginger e Fred", de Fellini, e "Matrimônio À Italiana", de Vittorio De Sica, que une o par perfeito do cinema italiano -Mastroianni e a atriz Sophia Loren. Sem a participação de Mastroianni, Guerra trabalhou no roteiro de outros clássicos de Fellini, como "E La Nave Va" e "Amarcord". Com voz embargada, em francês, Guerra lembrou seu último encontro com Mastroianni, há poucos meses, durante um almoço em Santo Arcangelo, e a lembrança mais forte, a última frase do amigo: "Escute, Tonino...". "Ainda estou aqui, esperando escutar o que ele queria dizer para mim", lamenta. Pelo telefone, de sua casa em Pennabilli (Itália), Guerra deu um depoimento à Folha. "Este ano eu vi Marcello em Rimini, porque Marcello queria muito fazer o filme do (Theo) Angelopoulos. E há dois meses ele disse a Angelopoulos: 'Escute, é preciso que você procure um outro ator. Eu estou muito doente'. É preciso dizer que Marcello era não apenas um grande artista, mas um homem formidável. Ele era muito irônico sobre tudo, até mesmo sobre sua doença. E tinha uma grande gentileza. É difícil contar uma história sobre ele. Quando nós comemos pela última vez, em Santo Arcangelo, em um restaurante que se chama Zaghini, por que ele gostava muito do tagliatelli do Zaghini, eu percebi em seu olhar que ele já estava muito longe. Em muitos momentos, ele me dizia, 'Tonino, escute...'. E o que me vem a memória, hoje, é ele se virando para mim e dizendo 'Tonino, escute'. E eu perguntava: 'então, o que é Marcello?'. E ele se voltava surpreso. Eu dizia: 'você me chamou'. E ele dizia: "Ah, bom... Não me lembro, eu esqueci". Eu guardei comigo esse dia, a última vez em que o vi. Recordo que ele se levantou em direção à luz que entrava pela porta com os ombros pouco leves, ombros doentes, como alguém que desejasse permanecer no ar luminoso, nos momentos luminosos. E pensei que ele estava abandonando tudo na luminosidade desta luz... É bastante difícil falar... Isso é tudo." (LAR) Texto Anterior: Bimbalham os sinos em louvor do homem feliz Próximo Texto: Cinema italiano tem 2ª morte Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |