São Paulo, sábado, 21 de dezembro de 1996
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Italiano soube resistir a Hollywood

AMIR LABAKI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Há três anos, quando da morte de Fellini, Marcello Mastroianni recusou-se a fazer declarações, sustentando que tudo soaria banal em comparação à sua grandeza.
O desaparecimento do também imenso Mastroianni, paradoxalmente, parece convidar a movimento contrário.
Se a importância de Fellini dispensava novos comentários, a marca decisiva de Mastroianni no cinema contemporâneo é um enigma a desvendar, muito devido à estratégia do próprio ator de subestimar teorias e interpretações.
Marcello Mastroianni dedicou sua carreira cinematográfica a romper com o estereótipo de don Juan forjada pelo filme que o projetou internacionalmente, "A Doce Vida" (1959), de Fellini.
Aquele belo ator, alto e esguio, programaticamente dionisíaco, soube resistir às tentações da tipologia fílmica e não se rendeu à capital dessas simplificações, Hollywood. Preferiu tornar-se o primeiro "latin lover" autocrítico.
Mastroianni forjou no cinema europeu a figura do sedutor pós-feminista, do homem em vertigem frente à ascensão dos direitos da mulher.
Escreveu com o próprio corpo filmes-ensaios sobre a condição masculina neste final de século, como "Ciao Maschio" (1977), de Marco Ferreri, e "A Cidade das Mulheres" (1980), de Fellini.
Antes mesmo do pedágio dos anos cobrar em beleza seu preço, ei-lo humanizando o velho Casanova e expondo os próprios limites (etários, físicos, técnicos) em "Ginger e Fred" (1985).
Resistiu o que pôde a Hollywood e, ao ceder, há quatro anos, o resultado sofrível lhe deu razão. A utopia do "cinema europeu" sofre um rude golpe com sua morte.

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