São Paulo, sábado, 21 de dezembro de 1996
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COMÉRCIO ESPÚRIO

A revelação feita ontem por esta Folha de que existe um comércio ilegal de concessões de rádios é grave e exige uma séria e detalhada investigação no setor. Independentemente de esse esquema envolver ou não diretamente membros do Executivo ou do Legislativo, está claro que circulam livremente dentro da administração pública pessoas que negociam benesses consequentes de sua proximidade com o poder.
Segundo a reportagem, a aquisição de uma concessão de uma rádio FM pode sair por valores entre R$ 50 mil e R$ 150 mil. O negócio é feito por agenciadores que contatam empresários ou outros possíveis compradores, recebendo comissões.
Confirmado junto a vários de seus participantes, que tiveram suas declarações gravadas, o esquema sugere que existem ramificações, não confirmadas, dentro do próprio Ministério das Comunicações.
Mas são fortes os indícios de participação de pelo menos um representante do Legislativo, o deputado federal João Iensen (PPB-PR). Em conversa telefônica gravada, o deputado confirmou que o contato com a intermediária Naura Beatriz Severo, sua assessora, garantiria privilégios na disputa por concessões de rádios. Devido ao teor de suas declarações, o deputado deve ser alvo de investigação. Se confirmada sua participação, Iensen deve ser punido, até mesmo com a cassação de seu mandato.
Pode não ser surpreendente, mas é vergonhoso para o país o fato de ainda circularem dentro do Congresso e do Executivo pessoas que se utilizam de sua posição para vender facilidades. O papel exercido por Naura Severo na oferta de concessões de emissoras mostra que há uma inaceitável permissividade quanto à existência de negociadores desse tipo.
Ao saber da denúncia, o ministro Sérgio Motta afirmou de pronto que se tratava de uma "quadrilha", sem influência dentro de seu ministério. Mas deve haver uma apuração rigorosa quanto a qualquer ligação dos envolvidos com o Executivo.
As concessões para rádio e televisão estão previstas para serem fornecidas por meio de concorrências públicas, o que é correto e louvável. Entretanto, é preciso que esse processo seja transparente e esteja distante de suspeitas de irregularidades. Ou ficará, desde seu início, desmoralizado por práticas espúrias que insistem em se alojar no serviço público.

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