São Paulo, domingo, 22 de dezembro de 1996
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Ceará usa linguagem local contra a Aids

AURELIANO BIANCARELLI
ENVIADO ESPECIAL A SALVADOR

"Pular a cerca" e 'àfogar o ganso" estão se revelando expressões certeiras para convencer o cidadão simples a usar camisinha. O trabalho foi desenvolvido no Ceará com o emprego de linguagem e do imaginário do nordestino e pode virar modelo para campanhas regionais.
A proposta do trabalho era convencer homens e mulheres de baixa escolaridade a usarem preservativo mesmo nas relações de casais. Antes de criarem os textos, as professoras Marilyn Nation e Maria Auxiliadora de Souza saíram a campo para recolher as expressões e conceitos que faziam parte das conversas cotidianas sobre temas como sexualidade, fidelidade e família.
O desenhista José Neves Brandão, autodidata e morador da Pirambu, a maior favela de Fortaleza, passou a ilustrar a situações.
O resultado é um conjunto de 20 painéis cheio de cores onde o "cabra macho" é alertado que mesmo "na terra de Lampião" o "bicho brabo" tem que usar camisinha.
O valente "pulador de cerca" pode não gostar de ouvir, mas fica sabendo que sua santa 'Amélia de casa não só diz amém" e pode estar saindo com outro alguém. Pelo sim, pelo não, é melhor manter a camisinha à mão.
'A matriz (a esposa oficial), nem sempre é santinha. Abençoada com a camisinha, ela faz milagres. Evite a Aids."
Maria Auxiliadora é professora aposentada da Escola de Medicina da Universidade Federal do Ceará. Marilyn é médica antropóloga da faculdade de medicina de Harvard e professora convidada da UFC. As duas dirigem o Instituto Conceitos Culturais. O projeto de prevenção tem o apoio do programa Family Health International.
Os cartazes são levados a reuniões em centros comunitários e locais públicos dos bairros. Apresentado no 1º Congresso Brasileiro de Prevenção das DST-Aids, na semana passada em Salvador, o projeto foi aplaudido. Pedro Chequer, coordenador do Programa Nacional de Aids, disse que pretende de levar a idéia para todos os Estados.
Nos seus contatos com moradores da periferia, as professoras constataram que a "comidinha rápida" não é vista como adultério. E homens e mulheres tendem a esquecer a camisinha. "Descobrimos que o fast food não é infidelidade. Já o jantar formal é."
Duro foi convencer que o "papai e mamãe" também precisa de camisinha e pode ser interessante. A fórmula encontrada pelas duas foi: " A camisinha tempera e dá sabor ao arroz e feijão".
Às mulheres que acreditam estar protegidas porque vigiam seus maridos, a campanha tem um conselho: "Pegando no pé, não lhe protege muié. Preocupe-se com você. Mande a Aids para o pequepê."

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