São Paulo, domingo, 22 de dezembro de 1996
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Camponeses enfrentam Sendero

RODRIGO BERTOLOTTO
DE BUENOS AIRES

Pichihuylca, vilarejo de casas de pau-a-pique cravado na selva do sudeste peruano, é o centro das atividades dos ronderos, milícia de camponeses que combate há 12 anos o Sendero Luminoso, maior grupo guerrilheiro do país.
"Não temos orçamento, estamos abandonados. Nem mesmo podemos comprar munição para nossas armas", disse o líder da milícia, Antonio Cárdenas, 31, ao jornal "Clarín", de Buenos Aires.
Atrás dele, uma centena de colonos e granjeiros empunha espingardas velhas e lanças.
"O Sendero está vivo e segue sendo uma ameaça para nós. Não nos perdoam que, por mais de uma década, resistimos, apesar de os louros todos serem do Exército", afirma esse homem de baixa estatura com problemas no braço direito, o que dificulta o manuseio de sua pistola Mauser.
O Sendero é mais um problema para essa gente que reclama de fome, malária, febre amarela e da baixa no preço da folha de coca.
O principal produto da região caiu de preço. Em dois anos, passou de US$ 5 pelo quilo da folha para os atuais US$ 0,50.
"A doença e a fome nos deixam tão fracos que os inimigos vêm e nos abatem a coronhadas ou a socos", diz Teodora Quichon, camponesa que empunha uma lança nativa, com a qual jura ter atravessado mais de um senderista.
Saldo da guerra
Desde 1980, quando se insurgiu o grupo maoísta Sendero Luminoso, o conflito entre guerrilha, camponeses e governo deixou no Peru um saldo de 25 mil pessoas mortas e um prejuízo ao país da ordem de US$ 30 bilhões.
"Os militantes senderistas seguem em atividade. Só a cúpula, e não toda ela, está detida. Uma prova disso foram os assaltos e assassinatos que praticaram nos caminhos próximos", afirma Cárdenas.
O líder máximo do Sendero, Abimael Guzmán, está preso.
Ele ficou célebre pela encenação em sua detenção: vestindo uma roupa listrada em preto e branco, Guzmán gritava e andava como um felino enjaulado.
O próprio Cárdenas já esteve preso pelas autoridades, acusado de assassinato, mas depois foi libertado. Segundo o líder miliciano, foi uma manobra de agentes de segurança que são subornados pelo Sendero Luminoso.
"Há muitos negócios entre a polícia e os senderistas arrependidos", diz ele.
Com os militares a relação é melhor. "Estamos coordenando com o chefe militar da área uma operação de busca na selva. Fazemos o inimigo entrar mais na mata para que não nos surpreenda."
Os milicianos chamam os senderistas de tucos, pássaros que vivem nos cemitérios e, segundo a lenda, cantam anunciando a morte.
"O presidente Alberto Fujimori mente quando diz que a subversão está derrotada", previa Cárdenas dias antes da ação do Tupac Amaru em Lima.
Todas as manhãs há treinamento. A milícia se posta na clareira central, com seus homens em fileiras. De joelhos, eles apontam para o horizonte sem disparar, porque não se pode desperdiçar uma bala.
"Muitos combatem por suas terras, que tiveram de deixar para trás pelas hostilidades do Sendero Luminoso", afirma o líder da tropa. "Eles querem somente voltar para suas casas."

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