São Paulo, domingo, 29 de dezembro de 1996
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Kasparov apela à Internet para 'conquistar' os EUA

'Sem mim, não há dinheiro', diz o campeão mundial na Espanha

LEONTXO GARCÍA
DO "EL PAÍS"

Aos 22 anos, ele foi o mais jovem campeão do mundo de xadrez. Hoje, aos 33 anos, vividos num ritmo galopante, Gari Kimovitch Kasparov perdeu amigos, simpatia e uma mulher, que emigrou para os EUA com a filha do casal.
Ganhou, porém, poder, uma outra mulher, um filho e mais de US$ 8 milhões em prêmios.
Kasparov acaba de vencer o Torneio Mundial de Las Palmas (Espanha) e já afronta novos desafios: conquistar os EUA, a Internet, popularizar o xadrez e se manter campeão até o ano 2000. Segundo ele, os demais jogadores o seguirão. "Sem mim, não há dinheiro."
Ao receber o "El País", não foi necessário que o repórter começasse a perguntar. Kasparov já se acomoda falando, principalmente sobre suas paixões mais recentes: os computadores e a Internet.
*
Gari Kasparov - Veja, agora viajo com esses dois computadores portáteis, muito potentes. Um analisa as partidas para mim, enquanto o outro corrige os erros. É fantástico. Faço em 15 minutos o que antes me tomava um dia.
Pergunta - E você não corre o risco de perder a criatividade?
Kasparov - Ao contrário. O computador ensina disciplina. Ganhei em precisão e rapidez de cálculo. Por exemplo, contra Anand (o indiano Viswanathan Anand, número dois do mundo) vi que íamos empatar com sete jogadas de antecedência, apesar de a posição ser muito complicada. Dessa forma, pude dedicar mais tempo durante a partida a idéias estratégicas, à parte artística do xadrez, e menos à execução tática.
Pergunta - A Internet é conveniente para o xadrez?
Kasparov - Sim. Graças a essa invenção, o cenário de um torneio será um gigantesco estádio onde milhões de pessoas poderão seguir as partidas ao vivo em suas casas. Estou quase finalizando um acordo com a IBM para criar o Clube de Xadrez Kasparov na Internet. Por um preço módico, os fãs poderão consultar uma base de dados com milhares de partidas, jogar entre si, receber aulas minhas ou manter debates. É uma revolução.
Pergunta - O seu duelo no início do ano com o computador Deep Blue, da IBM, foi um dos principais eventos esportivos do ano.
Kasparov - E a revanche já está acertada para maio de 1997, em Nova York. Admito que tenho um tremendo respeito por esse bicho. Deep Blue é mil vezes mais potente que esses dois computadores que eu uso. Pouquíssimos jogadores conseguiriam um resultado digno. Mas eu continuo carregando a bandeira do gênero humano na luta contra o chip. Depois de um torneio em fevereiro, não jogarei nada até maio para poder me preparar bem para esse fascinante desafio. Da última vez, ganhei, mas terminei exausto. E sei que o desempenho do Deep Blue melhorou.
Pergunta - O que aconteceu com as suas numerosas atividades políticas e de negócios?
Kasparov - Reduzi tudo ao mínimo. Quero ser o número um até o ano 2000 para que meu filho, que então terá quatro anos, desfrute da glória do pai, como já acontece com minha filha. Sofri muito no período de 1992 a 95 devido ao divórcio, à minha rebelião contra a Fide (Federação Internacional de Xadrez) e a criação da PCA (Associação de Jogadores Profissionais). Isso afetou o meu jogo, que só agora, com uma vida estável, está voltando ao seu melhor nível.
Pergunta - Você descarta o fim da disputa entre a Fide e a PCA?
Kasparov - Não quero nada com um tipo tão sinistro como Kirsan Iliumyinov (presidente da Fide). Seguirei meu próprio caminho, que é popularizar o xadrez nos EUA, por meio da Internet e de torneios espetaculares. E os demais jogadores de elite me seguirão. Sem mim, não há dinheiro.

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