São Paulo, segunda-feira, 30 de dezembro de 1996
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Já vai, 96? Adeus

Se pretendemos não ficar a reboque da globalização, temos de fazer uma revolução modernizadora
ABRAM SZAJMAN
Herdeiro do indesejável espólio legado pela crise mexicana, 1996 não deixa saudades. As elevadas taxas de juros do período, a demanda interna em queda e o desemprego em alta abateram-se sobre todos os setores produtivos, em particular sobre o comércio. E as medidas de flexibilização das políticas fiscal e monetária, adotadas com algum atraso para a transformação do quadro de dificuldades conjunturais, foram apenas pontuais.
O ano começou sob forte contração das atividades econômicas e assim permaneceu. Em março, o nível de emprego despencou. Segundo o Seade, 16% da mão-de-obra disponível no país esteve inativa naquele mês e, mesmo pelas conservadoras metodologias de pesquisa do IBGE, esse indicador preocupou, ao atingir a taxa de 6,38%. Nossa produção industrial caiu 9%, e o setor comercial sofreu declínio de 14,5% em seu faturamento.
Melhoria, lenta, só foi notada a partir de junho, via redução das taxas de juros e liberação dos prazos de financiamento.
De qualquer forma, o balanço do exercício deverá fechar com desemprego de 5,2% pelo IBGE e de 14% pelo Seade. A produção industrial aponta para um crescimento de 2,5%, meio ponto percentual acima do resultado de 1995, e o setor varejista da região metropolitana de São Paulo, para vendas físicas 3% superiores.
Inflação baixa e o montante elevado das reservas cambiais são resultados positivos obtidos em 96.
Mas, se esses dados transferem um certo grau de tranquilidade aos agentes econômicos, o fraco desempenho produtivo anual, o aumento da inadimplência, o déficit previsto de US$ 4,5 bilhões na balança comercial do país e, principalmente, o renitente desajuste das contas públicas trabalham em sentido oposto.
Mesmo assim, o comércio confia, porque acredita na queda dos juros, da média de 27% deste ano para um patamar, de janeiro a dezembro de 97, da ordem de 20%. E porque torce por outras estimativas governamentais, como a de PIB 4% maior e inflação situada entre 6% e 8%.
Mas o setor está consciente de que, sem mudanças estruturais, essas metas estarão comprometidas.
Por isso, espera por avanços substanciais nos processos de desindexação e privatização; atenção toda especial à liquidez do sistema em março e abril e à possível pressão das alíquotas de importação sobre os preços industriais; manutenção da política cambial, a partir do Índice de Preços no Atacado; e estreito controle das reservas, pré-calculadas hoje em torno de US$ 50 bilhões a US$ 55 bilhões.
Para o setor comercial, nada ou muito pouco disso será conseguido se continuarmos sem as reformas estruturais do Estado brasileiro. Se pretendemos não ficar a reboque da globalização, temos de empreender uma revolução modernizadora.
Começar substituindo nosso sistema tributário por outro, libertado do vil garrote da cunha fiscal, que tornará possível ao cidadão e às empresas em geral pagar impostos e ao Estado aumentar sua arrecadação, fiscalizá-la com eficiência e ter motivos justos para punir os devedores.
Precisamos também reduzir o tamanho do Estado, afastá-lo dos papéis de concorrente privilegiado da iniciativa privada e de empregador sem qualquer compromisso com eficiência e produtividade.
Conduzi-lo às funções básicas de promotor do desenvolvimento social, guardião da vida e da propriedade, além de árbitro dos contenciosos surgidos no âmbito da sociedade.
O caminho para o crescimento econômico sólido e sustentado é longo, porém está bem desenhado. Requer apenas trabalho e determinação. Quanto mais rapidamente ele for trilhado, menores serão os custos, o tempo gasto e as expectativas frustradas. Nesse sentido, o comércio cumprimenta esperançoso os próximos 12 meses, depois de, aliviado, despedir-se de 96.

Abram Szajman, 57, é presidente da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e dos Conselhos Regionais do Sesc (Serviço Social do Comércio) e do Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial).

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