São Paulo, terça-feira, 31 de dezembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O que os números calam

JANIO DE FREITAS

Tão logo saia, em relação ao Rio, o censo demográfico que o IBGE começou ontem a divulgar, informo a quem interessar possa que me tornarei um cidadão inexistente, pela convicção de que assim determina a "ciência estatística".
Mais uma vez, a contagem da população brasileira não me incluirá. Era já o caso, há tempos, de não esperar pelo reconhecimento de que nasci e tenho permanecido nestas terras mesmo nas ocasiões, e não foram poucas, em que nem a mínima sensatez assim recomendaria. Nos quatro censos entre o de 60 e o de 91, só por uma vez tive a feliz sensação de merecer, por poucos minutos que fosse, o interesse do governo e dos demógrafos.
A estatística me era muito desfavorável, mas neste ano o representante do governo e dos demógrafos me reacendeu as esperanças. Esteve em minha porta, naturalmente no horário mais impróprio para encontrar qualquer um que trabalhe, e com isso criou a expectativa do retorno jamais havido. Foi melhor assim. Posso, mais à vontade, continuar cético em relação a governos e convicto de que estatísticas só merecem uma atenção muito discutível. Assim mesmo, só umas poucas.
Está aí nas manchetes e nos telejornais, gerada pela sociedade ilimitada que reúne o jornalismo, os governantes e os economistas oficiais e oficiosos, a manchete de que "a inflação de 96 ficou em 9,2%". O êxito da política econômica é, considerando-se estritamente a inflação, acima do esperado até pelo próprio governo. Mas na composição do tão promovido IPCA-E do IBGE, que na verdade não cobre o ano todo, os gastos fundamentais de pessoas e famílias apresentam aumentos assombrosos, ou criminosos mesmo, quando comparados à inflação.
Por exemplo, 26% para habitação, 17% para transporte, 15% para saúde. Ao fim, porém, o "índice geral" fica em 9,92%. Como? São os diferentes pesos ou influências, obviamente irreais, atribuídos a cada item de gasto. Coisas de economistas, de estatísticos, de mágicos enfim. Fantástico, também, neste mesmo IPCA-E do IBGE é que, depois de toda a gaiatice, ele se destina apenas à fixação da Ufir. Os técnicos têm, é claro, explicações formidáveis para a multidão de diferentes índices de inflação e custo de vida. Pena que nenhum coincida com as realidades vividas pelas diferentes camadas sociais.
Só palavras
É simples a providência para que Fernando Henrique Cardoso não precise mais lamentar que o arquipélago de Fernando Noronha esteja "muito abandonado".
O presidente não precisará mais do que liberar as verbas orçamentárias que o Orçamento dotou para a conservação de Fernando Noronha, mas o seu governo reteve nos cofres -e não por falta de informação sobre as consequências.
Como sempre
A todos os que contribuíram para esta coluna com informações, sugestões, documentos e, não menos importante, com a simples leitura, o meu agradecimento e o meu pesar por não ter estado, ao longo do ano, à altura das colaborações.
Sem qualquer restrição pelas diferenças de idéias, preferências e esperanças, a todos desejo o mesmo 97 de tranquilidade segura e seguros afetos.

Texto Anterior: Crítica de FHC não reabre auditoria
Próximo Texto: Aumenta a reprovação aos governos de Covas e Alencar
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.