São Paulo, sexta-feira, 2 de fevereiro de 1996
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O avanço verde

LUÍS NASSIF

Ainda há uma enorme dificuldade para se separar questões substantivas de eventos meramente tópicos.
A prova é a desproporção da cobertura dada à mudança da banda cambial, em contrapartida ao quase sigilo com que se tratou o anúncio do chamado Protocolo Verde.
O protocolo foi assinado entre o Ministério do Meio Ambiente, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Ele subordinará praticamente todos os financiamentos do setor público e repasses de agências internacionais à prévia análise do impacto ambiental do projeto financiado.
A pouca cobertura dada ao evento se deve ao ineditismo de misturar economia e ecologia.
O assunto era ecológico demais para interessar aos jornalistas econômicos; e econômico demais para atrair os especialistas em meio ambiente.
E, no entanto, essa vinculação entre economia e ecologia constitui-se no mais importante passo em direção a uma política pública definitiva de controle ambiental -desde que o governo Montoro, em São Paulo, colocou o meio ambiente na agenda do poder público com o projeto de despoluição de Cubatão.
"Ratings"
O acordo coloca a análise ambiental como fator de peso na definição de custos de financiamentos e investimentos.
Do lado público, toda empresa controlada pelo governo terá que constituir uma Unidade de Controle Ambiental.
Do lado privado, todo financiamento com repasses do FAT (Fundo de Assistência ao Trabalhador, administrado pelo BNDES) e de agências internacionais, será submetido à análise ambiental.
Quanto maior o dano ambiental, maior o custo do financiamento.
Há uma lógica fiscal na penalização dos predadores, já que a devastação produz lucro individual, e a preservação, custo coletivo.
Mas, em que pese multas a predadores, a questão ambiental dependia basicamente da consciência de cada empresa.
Quando se casa ecologia com economia, muda-se de figura.
De um lado, coloca-se a questão ambiental no chamado núcleo duro do governo -a área econômica, responsável pela condução da política econômica.
De outro, transfere-se o controle ambiental à sociedade civil. Os bancos terão que constituir departamentos de análise ambiental para a concessão dos financiamentos vinculados.
O setor privado terá que desenvolver "ratings" (sistemas de avaliação) para projetos ambientais. Quanto maior o "rating" do projeto (isto é, quanto menos danos à área ambiental) menor serão os juros cobrados.
Mais que isso: abre-se espaço para entrar em um florescente mercado internacional de investimentos.
O Enviroment News -fundo para investimentos no meio ambiente, alimentado pelos principais países industriais- dispõe atualmente de US$ 300 bilhões.
Até o final do século, a perspectiva é de US$ 1 trilhão para este mercado ambiental -segundo informa o presidente do Ibama, Raul Jungmann, a quem coube a coordenação do protocolo.
O governo federal tem administrado apenas US$ 60 milhões anuais para projetos ambientais -o que dá idéia do enorme espaço que se tem para alavancar recursos.
Auto-sustentado
O estilo predador dos chamados "tigres asiáticos" constitui-se hoje em dia na maior ameaça ao seu desenvolvimento -ao lado das pressões sociais geradas por modelos políticos ditatoriais.
Por aí se percebe o lado grave das implicações do meio ambiente sobre a economia.
BC e inadimplência
Até meados do mês, o Banco Central irá apresentar uma proposta abrangente de renegociação das dívidas no sistema financeiro.
A proposta deverá contemplar não apenas os inadimplentes, mas o amplo universo de pequenas e médias empresas que, desde as exorbitâncias monetárias de maio do ano passado, passaram a rolar suas dívidas indefinidamente -que cresceram de forma exponencial.
Para mudar as regras do jogo, é intenção do presidente do BC, Gustavo Loyolla, reunir-se com a Febraban (Federação Brasileira das Associações de Bancos), para arrancar um compromisso dos grandes bancos, de que irão envolver-se nesse programa.
Da parte do governo, é possível que se tome alguma medida para redução da chamada cunha fiscal (o montante de impostos que encarece o crédito).

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