São Paulo, domingo, 4 de fevereiro de 1996
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Ministro propõe tornar férias facultativas

FERNANDO RODRIGUES; VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

VALDO CRUZ
Diretor-executivo da Sucursal de Brasília
O ministro do Trabalho, Paulo Paiva, preparou documento reservado que circula na alta esfera governamental e propõe a flexibilização de 12 dos 34 direitos sociais dos trabalhadores previstos na Constituição.
A idéia é manter os direitos no texto constitucional, mas permitir que convenções ou acordos coletivos de trabalho redimensionem a extensão do benefício.
Pela proposta de Paiva, ficariam para discussão em acordos coletivos, entre outros, os direitos a repouso semanal remunerado, férias e licença-maternidade.
É a primeira vez que o governo FHC sugere uma mudança na Constituição que envolve os direitos constitucionais trabalhistas.
Essa flexibilização faz parte de um esforço do governo para tentar reduzir o chamado "custo Brasil" -leis e regras que impedem mais investimentos produtivos no país.
A Folha obteve informações sobre o documento preparado por Paiva junto a integrantes da área econômica do governo. O ministro do Trabalho queria sigilo.
"Espero que a divulgação não prejudique as negociações", disse Paiva. A estratégia do ministro era negociar com trabalhadores e empresários antes de sugerir as mudanças na Constituição.
No seu documento, Paiva propõe a mudança em dois artigos constitucionais: o 7 e o 179. Apenas Pedro Malan (Fazenda) e Clóvis Carvalho (Casa Civil) receberam cópia do estudo.
O artigo 7 é o mais polêmico. É ali que estão todos direitos trabalhistas, resultado do Congresso constituinte de 1988.
Paiva propõe incluir uma frase ao final de 12 dos direitos trabalhistas: "salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo".
Com relação ao dia semanal de descanso, a nova formulação seria a seguinte: (são direitos dos trabalhadores) "repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo".
Se uma categoria de trabalhadores assim desejar, pode fazer um acordo coletivo com seus patrões para suprimir o descanso semanal remunerado.
Essa situação aparentemente ilógica é comum nos casos em que trabalhadores preferem se submeter a uma situação menos privilegiada a perder o emprego.
"Já estamos agora num processo selvagem do mercado de trabalho. Nosso objetivo é proteger o trabalhador, flexibilizando as regras para acordos", diz Paiva.
O ministro diz que "os direitos constitucionais são intocáveis" e que só levará sua proposta adiante "depois de buscar uma convergência na sociedade a respeito".
A outra mudança proposta por Paiva, no artigo 179, refere-se basicamente a micro e pequenas empresas.
Se for aprovada a mudança, acordos coletivos poderiam permitir condições diferenciadas para trabalhadores de micro e pequenas empresas.
"Hoje, isso não é permitido. Uma grande empresa metalúrgica muitas vezes tem condição de dar um aumento maior do que uma pequena fábrica", argumenta Paiva.
Para os sindicalistas, essa mudança constitucional não é considerada um avanço.
"Não dá para defender. Torra eu, torra o Vicentinho, torra todo mundo", diz Luiz Antônio de Medeiros, presidente da Força Sindical, normalmente favorável às propostas governistas.
No entender de Medeiros, a flexibilização proposta por Paiva poderia criar duas categorias de trabalhadores: os que terão sindicatos fortes para negociar bons acordos (a minoria) e os que terão de se submeter a contratos nos quais renunciem aos direitos constitucionais (a maioria).
Paiva pretende coletar mais opiniões como essa para tentar adequar sua idéia inicial. "A proposta de mudança constitucional só terá sucesso se todos os setores da sociedade participarem da sua redação", diz o ministro.
Positiva
Para o ministro do Planejamento, José Serra (PSDB), a idéia de Paiva é positiva.
"Talvez fosse melhor que os preceitos constitucionais fossem regulados por lei. Porque a lei permite matizar situações específicas e proteger eventuais injustiças", diz José Serra.
O ministro da Justiça, Nelson Jobim (PMDB), sugere outras medidas para flexibilização. "O fim da unicidade sindical é importante, pois cada sindicato poderia fazer o seu acordo coletivo de trabalho", afirma Jobim.
Atualmente, a Constituição permite apenas uma associação de trabalhadores por categoria. Paulo Paiva concorda com a sugestão do ministro da Justiça, mas acha que isso deveria ser abordado "numa fase seguinte".

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