São Paulo, domingo, 4 de fevereiro de 1996
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O rombo do Nacional

CELSO PINTO

O Banco Central constatou o que, de início, parecia inacreditável: o rombo patrimonial do Banco Nacional é mesmo de cerca de R$ 4 bilhões.
É um número espantoso. Corresponde a perto de um terço dos ativos do Nacional quando ele quebrou e é quatro vezes maior do que o mercado imaginava na época.
Ele torna a quebra do Nacional um caso mais de duas vezes pior do que o do Banco Econômico, onde o rombo patrimonial está estimado em R$ 1,8 bilhão.
Uma alta fonte do BC diz que "deve ter havido fraude". Esta, aliás, seria a única forma de explicar como o Nacional chegou a acumular um buraco desta proporção.
O Unibanco, ao examinar as contas do Nacional antes de decidir comprá-lo, havia estimado o rombo também em R$ 4 bilhões.
O desequilíbrio patrimonial é o rombo efetivo. Tanto o Econômico quanto o Nacional sofreram corridas nas semanas que antecederam sua quebra.
Com isso, ficaram sem dinheiro para zerar o caixa e tomaram bilhões de reais junto ao BC, ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica Federal.
São os problemas de caixa que levam um banco, afinal, a fechar as portas. No entanto, é o desequilíbrio patrimonial que determina se, feitas as contas finais, haverá ou não prejuízo.
Como o BC ficou com os bancos quebrados, seus desequilíbrios patrimoniais é que dão uma idéia do tamanho da conta que será paga pelo contribuinte.
O inquérito do BC sobre o Nacional só deverá estar concluído entre fevereiro e março.
A impressão do BC, por enquanto, é que eventuais fraudes e problemas com empréstimos devem ter tido origem não pela interferência da família Magalhães Pinto, controladora do banco, mas dos executivos que o dirigiam.
O modelo de gestão do Nacional, comum no mercado financeiro, previa comissões aos executivos pelos resultados obtidos.
Na descrição da fonte do BC, "como a receita dos empréstimos é apropriada em regime de competência, mas seu pagamento efetivo se dá ao longo da vida do empréstimo, há um estímulo para privilegiar o risco".
Traduzindo: os executivos ganhavam suas comissões pelo volume de negócios que faziam. Embolsavam os bônus de imediato, mesmo que os empréstimos acabassem se revelando, mais tarde, incobráveis.
A média de empréstimos inadimplentes no sistema financeiro é 8%. Se no Nacional ela chegou a mais de 30%, a fiscalização do BC deveria ter detectado.
Mesmo que o buraco patrimonial do Nacional chegue a R$ 4 bilhões, a conta final para o contribuinte poderá não ser tão grande.
Na verdade, a engenharia montada para o Nacional foi tão complexa que é muito difícil fazer contas.
O Unibanco assumiu cerca de R$ 8 bilhões em passivos do Nacional e ficou com apenas R$ 5,4 bilhões em ativos. Outros R$ 2,6 bilhões foram uma injeção em seu caixa.
Em contrapartida, pagou quase R$ 1 bilhão em ações do próprio banco, dos quais R$ 300 milhões foram considerados "ágio" pelo intangível do Nacional (mas que poderão ser abatidos do imposto de renda futuro do banco).
Receber dinheiro vivo foi uma vantagem. No entanto, o Unibanco ficou com algumas contas futuras, como a do enxugamento de funcionários.
O Nacional podre que ficou nas mãos do governo engoliu em seu passivo R$ 5,6 bilhões em recursos da linha do Proer.
No ativo, absorveu mais de R$ 6 bilhões em títulos do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS).
Estes FCVS são dívidas do governo ao sistema bancário que, por nunca terem sido pagas, foram contabilizadas como prejuízo por vários bancos e valiam muito pouco no mercado.
O governo aproveitou a quebra do Nacional para comprar os FCVS do Bradesco, Itaú, Real, Unibanco, Safra e BCN por algo entre 35% e 45% de seu valor de face.
Os bancos, que já não imaginavam receber um centavo, ficaram contentes em receber alguma coisa.
O governo, por sua vez, recomprou uma dívida sua com grande deságio e contabilizou-a, no ativo do Nacional podre, pelo valor de face.
Supondo que a dívida, um dia, tinha que ser honrada, o governo ganhou exatamente a parcela do deságio que os bancos privados perderam.
Os bancos ainda ganharam o direito de continuar contabilizando os FCVS, até o vencimento, como parte das aplicações obrigatórias (menos rentáveis) que devem fazer no setor imobiliário.
A conta final do Nacional teria que considerar, de um lado, o deságio do FCVS, os pagamentos do Unibanco (menos os subsídios fiscais) e agregar a eventual execução dos bens de acionistas e dirigentes.
Do outro, somar ao rombo patrimonial o subsídio implícito nos juros mais baixos do Proer.
Um prêmio para quem tiver uma boa estimativa.

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