São Paulo, terça-feira, 6 de fevereiro de 1996
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Lágrimas de crocodilo

Imaginava-se que o fim da inflação traria grandes problemas para as instituições financeiras.
Os resultados dos bancos em 95, entretanto, desmentem essa tese.
Há razões para o sucesso de muitos bancos, a começar pelo fracasso de alguns concorrentes. A dinâmica da própria crise favorece muitas instituições com a fuga de recursos de bancos tidos como frágeis.
Outra explicação para o bom desempenho vem da cobrança de tarifas por serviços antes gratuitos ou da elevação de tarifas nos casos em que já se cobrava alguma coisa.
O ganho inflacionário, o chamado "float", era uma apropriação perversa, transferindo recursos para os bancos sem contrapartida produtiva ou em serviços.
Entretanto, se acabou o "float", seria ainda ingênuo acreditar que a boa performance de muitos bancos tem origem agora apenas numa eficiência maior ou nas tarifas.
A lógica da política econômica, como se sabe, privilegiou em 1995 o remédio dos juros elevadíssimos. Deu-se origem assim a um fluxo extraordinário de endividamento externo protagonizado sobretudo pelos bancos. Internalizados os recursos, captados no exterior a custos declinantes, muitas instituições puderam engordar seus caixas emprestando dinheiro para o governo.
A inflação gerava uma socialização de prejuízos e uma concentração de ganhos no sistema financeiro. O fim da inflação, entretanto, ainda não significou o fim de uma lógica igualmente perversa. Agora a sociedade, via Estado, transfere recursos fiscais para as contas dos bancos, muitíssimo bem remuneradas pelo Tesouro Nacional.
Falta fazer quase tudo para criar um sistema financeiro sadio e compatível não apenas com inflação baixa, mas também com juros baixos. Antes disso, a tese de que os bancos perdem muito com o fim da inflação fica sob suspeita, como são suspeitas as lágrimas do crocodilo.

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