São Paulo, terça-feira, 6 de fevereiro de 1996
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Peça de terror

Existem diversos gêneros literários. Apenas na ficção há a tragédia, a comédia, a ficção científica e o terror, entre outros. Já se repetiu à exaustão que o Orçamento brasileiro é uma peça de ficção. Agora constata-se com mais exatidão que é um livro de terror.
Ninguém, nem mesmo o governo, duvida de que o Brasil carece de investimentos na área social. A miséria, a ignorância e as doenças ainda constituem os maiores entraves ao desenvolvimento nacional.
Na hora da execução orçamentária, contudo, são justamente os investimentos prioritários que saem prejudicados. Como esta Folha revelou em sua edição de ontem, das verbas previstas para a infância de janeiro a setembro de 1995 apenas R$ 1,6 bilhão dos R$ 3,8 bilhões foram de fato repassadas, ou seja, 42% do total.
Enquanto os investidores receberam em dia os juros escorchantes, as crianças tiveram menos da metade do que a sociedade, por meio de seus legítimos representantes, decidiu destinar-lhes.
Sempre superestimando receitas e subestimando despesas, o governo não consegue já há muito criar uma peça orçamentária com um mínimo de consistência. Como alguns pagamentos são obrigatórios (juros, salários, Previdência), a solução acaba sendo avançar nas verbas destinadas aos mais carentes.
Estes estão sempre nos belos discursos dos políticos. Falta-lhes agora um lobby eficiente para que o prometido seja dado. O que hoje é peça de terror poderia, pelo menos, tornar-se um suspense mais leve.

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