São Paulo, sábado, 10 de fevereiro de 1996 |
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Danos morais e austeridade aos servidores federais
FERNANDO PIMENTEL DE SOUZA O governo FHC tem procurado demonstrar que o déficit do Orçamento da União é devido a gastos com seus servidores para justificar suas reformas, mas tem sido tendencioso e omisso para com os principais responsáveis.Já não se fala em excesso de servidores, mas de gasto no Orçamento, omitindo os pagamentos da dívida e dos juros, quase iguais à folha de pessoal em 1995. Apesar do arrocho nos gastos federais, paradoxalmente a dívida interna do Brasil dobrou em 1995 (US$ 110 bilhões), ultrapassando a dívida externa, a maioria para empréstimos subsidiados. Urge limitar os juros e as dívidas da União, Estados e municípios, sobretudo num ano eleitoral, sob pena de esta despesa ultrapassar a de pessoal e provocar mais recessão e aperto no orçamento. O Ministério da Administração divulgou uma "lista negra" dos maiores salários federais, que ultrapassavam o teto constitucional de R$ 6.400. Eram menos de 12 mil em 600 mil; portanto, menos de 2%. O maior -R$ 14.800- foi um erro grosseiro, pois se tratava de uma professora com vários salários atrasados. Enfatizaram que nove entre os dez maiores salários eram de docentes universitários, dando a impressão de privilégios no setor; mas todos eles acumulavam aposentadoria com salário nos altos escalões do atual governo. Porém a maioria na "lista negra" era de servidores da ativa, de categorias minoritárias privilegiadas pelo atual governo: polícia, diplomacia e Receita (até parece que estamos na Idade Média!), que são os únicos que podem chegar ao teto de R$ 6.400. A "lista negra" falhou em não mostrar outros que acumulavam aposentadorias estaduais, especialmente das universidades de São Paulo, municipais e INPS. Poucos da cúpula do atual governo federal, provavelmente, escapariam desta "maldita" lista. Não se deu a verdadeira noção dos atuais salários na universidade federal. Um professor em fim de carreira, titular, com cursos de pós-graduação, não podendo ter outro emprego, gerindo dezenas de jovens em sala de aula e projetos de pesquisas sem recursos, com cobrança de produção, orientando pós-graduandos, atualizando-se com os próprios meios, fazendo conferências e administração gratuitas, com todos os adicionais de 25 anos de serviço etc. ganha R$ 2.500 líquidos. Isso é bem menos do que no Primeiro Mundo, menos caro e com mais recursos, ou do que recebe um gerente administrativo em São Paulo. 3% dos servidores têm salários menores do que um mínimo, sem contar os terceirizados -cerca de 30% com salários menores do que três mínimos, o que é impensável na atividade privada. A realidade é bem o contrário, pois cerca de 98% dos servidores são tratados com austeridade, até mesmo miséria, e precisam manter e resgatar a dignidade para suportar o ônus de suas obrigações necessárias e até prioritárias. Na condenada "lista" não constam servidores do Legislativo e do Judiciário, estatais, militares, Estados e municípios, excluindo milhares de fabulosos salários mensais de até R$ 70 mil, desmedidos até no Primeiro Mundo. Os mais importantes marajás foram acobertados da maledicência e são as maiores ameaças ao sucesso das reformas. A independência dos três Poderes é quanto ao exercício da função. Não se pode conceder a dois deles legislar em causa própria quanto aos seus vencimentos. Falta contrapartida previdenciária dos parlamentares e juízes, dos adicionais de chefia e por tempo de serviço em cascata etc., que incham excessivamente os salários dos maiores marajás, pouco antes de irem para a inatividade, e a folha dos aposentados. As aposentadorias médias no Legislativo e no Judiciário são sete vezes maiores do que a média do Executivo, segundo Araujo em "Previdência Social", e se igualam ao máximo do professor universitário em final de carreira. Enxugar essa área deveria ser questão de honra para a moralização do país na reforma constitucional. Juízes e políticos, imbuídos de espírito patriótico, deveriam se compenetrar da justeza da causa. Não se deve diferenciar sexo na aposentadoria, se a mulher ainda vive um pouco mais para ser sustentada, onerando a Previdência e deixando de arrecadar fundos. A maioria dos servidores públicos federais paga INSS de 12% do salário integral. Este sempre foi mais aviltado do que o da iniciativa privada -que paga só 8% sobre o teto de dez mínimos- e não recebe FGTS. Essas diferenças, na base de 25%, devem contar na Previdência, que em 30 anos, supondo o salário dobrado no final da carreira, provê fundos para receber 11 anos de pensão. Para uma longevidade de 66 anos, a aposentadoria, com salário integral, deveria ser aos 55 anos, ou os vencimentos deveriam ser aumentados. Para obter superávit no Tesouro e na Previdência da União, urge depurar primeiro essas principais agravantes e cobrar impostos dos sonegadores, para enfrentá-los objetivamente e não punir indevidamente a maioria dos servidores públicos federais. Texto Anterior: A utopia do ano 2000 Próximo Texto: Argentina produz menos carros Índice |
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