São Paulo, domingo, 11 de fevereiro de 1996
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Câmbio pode ficar parado

CELSO PINTO

A taxa de câmbio, se depender do Banco Central, poderá não mover um milímetro este ano, apesar da nova banda.
É uma questão polêmica na área econômica do governo, mas o diretor da Área Externa do BC, Gustavo Franco, acha que seria possível engessar a cotação do real frente ao dólar, sem reduzir a competitividade das exportações.
Supondo que não haja "atrasos" cambiais a corrigir, para manter as exportações competitivas, o câmbio deveria levar em conta a variação dos custos internos e descontar a variação do custo dos parceiros comerciais.
O BC tem usado como parâmetro para mensurar quanto subiu o custo dos produtos industriais exportáveis, a variação do IPA (Índice de Preços por Atacado) industrial.
Considerando a elevação esperada do IPA industrial e deduzindo a variação do índice equivalente dos Estados Unidos, diz Franco, seria preciso subir o câmbio no ano em algo entre 6% e 7% para compensar a inflação brasileira maior.
No entanto, não basta comparar as taxas de inflação. Se uma indústria consegue aumentar sua produtividade, isso significa que ela consegue produzir mais com menor custo.
Comparando-se o aumento da produtividade brasileira, que vem crescendo 7% ao ano, com o aumento da produtividade americana, a diferença é favorável ao Brasil em cerca de 6%, lembra o diretor do BC.
Ou seja, o que as empresas brasileiras deverão sofrer a mais por aumento de custos, poderão ganhar com a maior produtividade.
Logo, conclui Franco, "não tem o que fazer com o câmbio".
Pode-se discutir alguns pontos. Existem custos de produção que não estão incluídos no IPA.
As comparações de custos e produtividades deveriam considerar os principais parceiros comerciais, não apenas um deles.
A produtividade brasileira pode estar algo superestimada por fatores como a terceirização.
O importante, contudo, não é discutir as minúcias das contas, mas o fato de Franco admitir a hipótese de a taxa de câmbio não variar este ano.
Desde a primeira grande mudança na banda cambial, em março do ano passado, a taxa de câmbio vem seguindo de perto o IPA industrial.
É uma forma de apoiar as exportações, mas tem um grave inconveniente.
Como neste período houve uma enxurrada de entrada de dólares, se o câmbio fosse deixado livre ele iria se valorizar (ou seja, o real ficaria mais forte frente ao dólar) e não se desvalorizar.
Para forçar a desvalorização, o BC teve que entrar, todo este tempo, como comprador de dólares no mercado. Com isso, teve que emitir reais.
Para evitar que os reais tivessem um efeito inflacionário, o BC os recolheu vendendo títulos da dívida pública com juros altíssimos.
"Congelar" a taxa de câmbio traria um alívio por este lado. Poderia, também, desacelerar o ritmo de entrada de dólares.
Certamente ajudaria a manter a inflação em níveis ainda mais baixos do que os atuais, ao redobrar a aposta na âncora cambial.
Qual o risco? Se esta política, ao contrário do que imagina Franco, afetar as exportações, poderá levar a um déficit na balança comercial.
Com isso, aumentaria o déficit em conta corrente, que mede o buraco das contas externas. Aí começam as divisões internas no governo.
Desde a crise do México, convencionou-se considerar que um déficit em conta corrente latino-americano superior a 2,5% ou 3% do PIB poderia levar os investidores externos a perder a confiança, tirar o dinheiro e levar o país à crise.
Franco diz que isso é "um mito": vários países em desenvolvimento mantêm um déficit em conta corrente superior a 4% do PIB, sem problemas para financiá-lo. O Brasil poderia fazer o mesmo.
A Secretaria do Planejamento, todos sabem, não concorda, assim como não concordam economistas importantes no Ministério da Fazenda.
A percepção é que o déficit de 3% do PIB do ano passado já bateu no limite prudente.
Como as exportações cresceram pouco no ano passado, haveria uma tendência a um déficit comercial crescente caso a economia crescesse muito mais do que medíocres 2% a 3% ao ano, elevando o déficit em conta corrente.
Franco discorda inteiramente. Acha que as exportações estão crescendo a taxas razoáveis, sem precisar de mais incentivos.
O BC projeta um déficit em conta corrente próximo a 3% do PIB para este ano e o próximo, um crescimento econômico de 4% ao ano e um superávit comercial de US$ 1,5 bilhão este ano e US$ 3 bilhões no próximo. Se o BC estiver certo, está tudo resolvido.
Nem todos no governo concordam e há os que defendem uma aceleração da desvalorização como necessária. São os mesmos que levaram à recente mudança da banda, a despeito das idéias de Franco.

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