São Paulo, sexta-feira, 16 de fevereiro de 1996 |
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O preço da cidadania
CLÓVIS ROSSI SÃO PAULO - Por fim uma autoridade consegue descobrir com rapidez quem são os culpados pelas vítimas das inundações ao menos no Rio de Janeiro. Os culpados são as vítimas. É o que diz o prefeito da cidade, César Maia, ao responsabilizar o pessoal que continua morando nas encostas, apesar de advertido para o risco.Em vez de se mudarem para algum condomínio fechado na Barra, a turma continua preferindo ficar nos barracos. Nem sequer se dá ao cuidado de, durante a temporada de chuvas, alugar um "flat" em Miami, até que passe o perigo. São uns teimosos, mesmo. No fundo, o prefeito César Maia tem até razão, ao menos na ótica do Estado brasileiro. No mesmo dia em que ele descobria os culpados, o chefe da Polícia Civil também do Rio de Janeiro, delegado Hélio Luz, era o entrevistado do "Programa Livre" que Serginho Groisman apresenta no SBT. Muito bem. Uma garota cobrou do delegado a falta de proteção aos favelados, ainda aludindo à polêmica em torno do clipe de Michael Jackson. Resposta assustadoramente franca de Hélio Luz: a polícia foi feita mesmo para proteger quem ganha de R$ 1 mil para cima. Não foi dito como deboche, com um sorriso cínico na face, não. O delegado apenas constatou uma realidade: ante a distorção absurda que existe no Brasil, em termos de distribuição de renda, e ante o fato óbvio de quem ganha mais pode mais, o que acaba acontecendo é que a polícia serve apenas a essa camada privilegiada. Quanto ao resto, ou seja, a massa favelada, sempre segundo Hélio Luz, não é um problema de dar-lhe proteção, mas mantê-lo sob controle, para que a estrutura não desabe de uma vez. O que o delegado diz é, de certa forma, o que diz o prefeito. O Estado protege -se mal ou bem, é outra discussão- o pessoal que não mora nas encostas sob risco. Quem mora que se vire na hora do perigo. Ou morra. São momentos que iluminam melhor do que mil teses acadêmicas a realidade brasileira. Ao menos já se sabe que a cidadania, por aqui, tem preço. Acima de R$ 1 mil. Texto Anterior: Avaliando o ensino Próximo Texto: Maluf faz uma proposta Índice |
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