São Paulo, domingo, 18 de fevereiro de 1996
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Empregar é necessário

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Empresários e trabalhadores chegaram a um acordo num dia e a Justiça do Trabalho desmanchou-o 48 horas depois sob a justificativa de que o acerto era ilegal por eliminar a carteira de trabalho e substituir as contribuições do INSS e FGTS por outras não-previstas na Constituição e na CLT.
A ação da Justiça não foi novidade para ninguém. Advogados, juristas e as próprias partes previam essa conduta, pois o acordo introduziu uma forma de contratação que contraria o quadro legal atual.
Tanto que, na cláusula 14ª, os signatários do acordo assumiram o compromisso de encaminhar uma cópia do mesmo ao Congresso Nacional para que "o legislador venha a adequar a legislação brasileira às modernas necessidades e realidades do mercado de trabalho".
Uma vez assinado o referido instrumento, as empresas passaram a abrir vagas e as filas de candidatos tornaram-se quilométricas -todos interessados em trabalhar.
O fato serviu para colocar bem às claras a obsolescência das nossas leis trabalhistas. Empregados e empregadores acharam útil definir entre si bases realistas de trabalho e, como era esperado, a lei barrou.
A pergunta a fazer é simples: quem deve mudar? A realidade ou a lei?
Que os juízes tenham feito o que fizeram, não há o que contestar. É a sua função zelar pela obediência à lei.
Mas que o governo e o Congresso se mantenham impassivos diante da necessidade de promover mudanças na lei para favorecer o emprego é lamentável.
A Constituição de 1988 deu início a um processo de mudança ao instituir dois "direitos flexíveis" no artigo 7º. O inciso VI diz que o salário é irredutível, salvo negociação.
O inciso XIV reza que a jornada diária (para quem faz revezamento) é de 6 horas, salvo negociação.
A expressão "salvo negociação" abre um amplo espaço para o entendimento direto entre as partes. Quando uma delas não quer negociar, vale o que está no princípio.
Mas, quando as duas querem negociar, elas podem fazer o que julgarem melhor nesses dois campos. É isso que está faltando em outros princípios constitucionais para dar amparo aos que desejam negociar.
Portanto não há a menor necessidade de revogar os direitos sociais. Trata-se, apenas, de criar mecanismos para que eles possam ser negociados quando as partes assim o desejem.
Se o constituinte fez isso com a jornada e o salário, por que não se examinar a extensão dessa medida para outros itens da longa lista de direitos sociais?
A discussão desse tema foi aberta. O acordo foi embargado. Mas o caso não é para ser esquecido. Ele vale como um estridente brado de alerta ao governo e ao Congresso Nacional.
Ele reflete a vontade de quem precisa de emprego e de quem precisa produzir. O que há de errado nisso?

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