São Paulo, segunda-feira, 19 de fevereiro de 1996 |
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A ressaca veio antes da quarta-feira de Cinzas
MARCELO FROMER; NANDO REIS
É impressionante! Estamos assistindo a uma verdadeira overdose de partidas pelo país todo. São inúmeros torneios, campeonatos, amistosos despejados em nossas TVs todas as noites, como se o futebol fosse uma novela diária com seus infindáveis capítulos. Certamente muito casamento já deu sinal de desgaste, o maridão passando noites seguidas estendido no sofá à espera dos gols... Para nós, meros espectadores, assistir uma peleja não deixa de ser uma deliciosa recompensa ao fatigado cérebro e ao esqueleto massacrado. Só que para que isso ocorra é preciso que haja pelo menos 22 sujeitos em boa forma física, correndo atrás de uma pelota, literalmente suando a camisa. E a consequência imediata dessa estúpida maratona, quando os clubes acabam jogando praticamente dia sim, dia não, é o desgaste físico e mental que, em pouco tempo, vai sacrificar a qualidade das partidas em virtude de contusões, dores musculares e o estresse gerado pela permanência excessiva em hotéis, aeroportos, aviões e, pior, em campo! E disso nós sabemos um bocado, com a diferença que o nosso gramado é a palco. Alguns jogadores, por meio de declarações, vêm tentando alertar a todos sobre as consequências desse tipo de prática, mas parece que suas vozes batem e voltam num muro à prova de som e sensatez. Henrique, o zagueiro do Corinthians, Sandoval, atleta do São Paulo, andaram se pronunciando sobre o tema, mas suas vozes ecoaram inúteis, quase patéticas, nesse oceano de burrice que inunda os escalões superiores. É chegada a hora dos grandes interessados se manifestarem mais incisivamente sobre o tema. Os jogadores precisam encontrar uma forma de impedir que esta onda atinja proporções havaianas e venha afogá-los no mar de jogos e compromissos. Todos perguntam e querem saber o porquê do aumento das expulsões e dos cartões. Aí está mais um importante ingrediente a ser analisado nessa enorme salada chamada futebol brasileiro. O jogador estressado está muito mais apto a cometer uma asneira. Mais uma vez, abusando do paralelo, sabemos que, assim como nós, músicos, os jogadores não são unidos. A vaidade, a competitividade, nos impedem de agir como classe. Vozes dispersas que não alcançam a ressonância de um coro. E mais, também sabemos muito bem da diferença de interesses que trafega entre os dirigentes -para nós, o empresário- e os jogadores. Se eles não derem um basta, não será o Farah que irá fazê-lo. Pois ao final das contas, quem entra no palco, no gramado, somos nós, músicos e jogadores. E apesar de muitos, estamos é muito sós. Que pena! Marcelo Fromer e Nando Reis são músicos e integrantes da banda Titãs Texto Anterior: 'Só quis ser educado' Próximo Texto: A estratégia da folia Índice |
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