São Paulo, segunda-feira, 19 de fevereiro de 1996 |
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Rindo de quê? Valdo Cruz BRASÍLIA - Na última quinta-feira, enquanto o presidente do Congresso, José Sarney, abria oficialmente os trabalhos de 1996, um exemplar da Folha corria de mão em mão no plenário. Naquele dia, o jornal publicava a lista dos deputados que assinaram uma proposta de manutenção de um antigo privilégio, o IPC (o instituto que garante a aposentadoria dos parlamentares). A relação trazia 224 assinaturas. O leitor deve imaginar que todos reagiram irritados quando toparam com a lista publicada pela Folha. Afinal, ela tornava pública uma manifestação explícita de corporativismo dos deputados, exatamente num momento em que está em jogo a aposentadoria dos trabalhadores. Ledo engano, meu caro leitor. Alguns parlamentares não se continham e soltavam gargalhadas. Ficavam procurando os seus nomes e o de colegas na extensa lista, com os dedos. A cada descoberta, uma nova risada. A cena, presenciada pela reportagem da Folha, é, no mínimo, infeliz. Em vez de ficarem se divertindo com a exposição do seu corporativismo, os deputados que consultavam o exemplar do jornal deveriam se esconder debaixo das cadeiras do plenário. Afinal, o IPC é uma regalia indefensável. Um parlamentar pode se aposentar aos 50 anos, depois de exercer apenas oito anos de mandato, com um benefício de R$ 2.080. Já o trabalhador do setor privado não goza do mesmo privilégio: aos mesmos 50 anos, ele terá direito a uma aposentadoria que não chega a R$ 800, desde que tenha trabalhado durante 30 anos. E a mamata do IPC não fica apenas na aposentadoria. O instituto oferece empréstimos com juros subsidiados -2,5% ao mês-, enquanto o eleitor tem de suportar taxas mensais que variam de 6% a 9,5%. Financia ainda o carro novo ou usado em até 36 meses. Além disso, vende pacotes de viagens com descontos em hotéis cinco estrelas. Em tempo de reformas, o Congresso deveria dar o seu exemplo, acabando com esse manancial de privilégios. Os líderes dizem que vão insistir no fim do IPC. Resta saber se os parlamentares vão seguir a orientação das lideranças ou continuarão rindo à custa do eleitor. Texto Anterior: Somos todos Nilson Gibson Próximo Texto: O Carnaval da peste Índice |
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