São Paulo, quinta-feira, 22 de fevereiro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Como os bancos fogem do IR

ALOYSIO BIONDI

Essa história de que os bancos estão brigando na Justiça para pagar menos Imposto de Renda, e por isso a arrecadação do Tesouro caiu, é apenas meia verdade.
Na realidade, os bancos estão usando de expedientes para provocar falsa redução nos lucros (mesmo assim, fantásticos) nos balanços de 95 e deixar de recolher IR.
Quem revela a estratégia são os próprios diretores dos bancos, em entrevistas surgidas diariamente na imprensa. Para entender o que está acontecendo:
. Briga legal - como largamente noticiado, Banco Central e Receita Federal têm regras diferentes, que os bancos devem seguir, na elaboração de seus balanços.
Tanto o BC quanto o Leão permitem que as dívidas não pagas dentro do prazo pelos clientes dos bancos sejam lançadas como prejuízos temporários, reduzindo os lucros.
Mais claramente: os bancos podem fazer "reservas", ou provisões, para garantir a cobertura desses débitos em atraso, se eles realmente nunca forem pagos.
Onde a diferença? Nos prazos de atraso. O Banco Central permite que os "prejuízos" sejam lançados depois de um atraso de 60 dias. A secretaria da Receita, somente depois de um ano e esgotadas as possibilidades de cobrança.
Os bancos entraram na Justiça querendo adotar apenas os critérios do BC e, com isso, suspenderam parcialmente o pagamento do IR. A queda da arrecadação no setor chegou aos 60% em janeiro.
. A estratégia - até aí, tudo normal: recorrer à Justiça é direito de todos. Mas os bancos estão indo bem mais longe para reduzir o IR: estão lançando nos balanços reservas "inchadas", muito acima dos limites determinados pelo Banco Central, reduzindo artificialmente os lucros e o IR.
. Confissões - a prática é generalizada, mas bastam três exemplos para avaliar a extensão dessa estratégia, retirados de entrevistas de diretores dos bancos.
Banco A - lucro de R$ 150 milhões, ou 11% sobre o patrimônio: as provisões subiram 13 vezes, para R$ 250 milhões. Causa: o banco "chegou a considerar como empréstimos em atraso os que não haviam sido pagos um dia (sic, sic) depois do vencimento".
Banco B - lucro de R$ 540 milhões, ou 11% sobre o patrimônio: provisões de R$ 970 milhões, ou iguais a 1,6 vez os créditos duvidosos de R$ 610 milhões.
Banco C - lucro de R$ 33,5 milhões, ou 23% sobre o patrimônio: as provisões subiram 475%, para R$ 13,8 milhões. Causa: "O BC faculta aos bancos provisionar 20% dos créditos em atraso há 60 dias, mas decidimos provisionar 100%".
O rombo
Em 1995, o Imposto de Renda pago pelos bancos, com base nos lucros de 1994, ficou na faixa dos R$ 3,0 bilhões. Neste ano, com o aumento dos ganhos, poderá chegar aos R$ 4,0 bilhões. Prevê-se queda de 50%. Ou menos R$ 2,0 bilhões.
Os lucros
As maiores empresas brasileiras lucraram, em média, 2% sobre o patrimônio líquido em 1995, de acordo com os primeiros balanços divulgados.
Grandes bancos vêm declarando lucros de 12% sobre o patrimônio. Pequenos e médios bancos, de 20% a 30%. Nos dois casos, podem ter sido o dobro -como mostram as "provisões" inchadas...
Mito
Os bancos ganharam várias reduções de impostos na "reforma tributária" do governo FHC. Como é mesmo aquela historinha neoliberal de que só há sonegação quando impostos são excessivos?
Escalpelados
Os lucros dos bancos vieram, em grande parte, do salto nas receitas das "tarifas". Descobre-se agora que há bancos cobrando 20%, ao ano, para administrar o dinheiro dos clientes aplicados em funções similares.
Como essas aplicações vêm rendendo na faixa de 25% ao ano, sobram ridículos 5% ao ano para os donos do dinheiro. Há casos de até 0,17% de rendimento ao mês.
Polianas
Ao longo de janeiro, o noticiário otimista tentou mostrar que a economia ia bem, obrigado.
Uma "prova" insistentemente citada: as vendas de embalagem de papelão estariam aquecidas. Desempenho real, noticiado escondidinho: houve queda de 13,5% sobre janeiro de 1995.
Dólar
Bom lembrar: o ano fiscal nos EUA e em outros países ricos é fechado em março. Para fechar seus balanços, filiais de multinacionais costumam remeter dólares de volta aos países de origem a partir do final de fevereiro.

O colunista PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. está em férias

Texto Anterior: Importações aumentaram 334% em 1995
Próximo Texto: Presidente do Fed admite corte nos juros
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.