São Paulo, domingo, 25 de fevereiro de 1996
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Carnaval faz país adotar 'calendário chinês'

AURELIANO BIANCARELLI; LUCIA MARTINS
DA REPORTAGEM LOCAL

Na última quinta-feira, o telefone do publicitário paulistano Leonardo Brant voltou a tocar no mesmo ritmo de dezembro. Em três conversas com colegas de outros Estados ele ouviu a frase "feliz Ano Novo".
Não eram amigos da China. Naquele país, o Ano Novo começou na segunda-feira, dia 19. No Brasil, o Carnaval quase fez coincidir os calendários. O ano, de fato, só começa agora.
O espírito de festa que antecede o Natal e só termina na quaresma paralisa negócios, esvazia lojas, fecha escolas, adia casamentos e empurra check-ups e aulas de ginástica para depois.
A agência de empregos Manpower decidiu aproveitar o "início do ano" publicando um anúncio na Folha no domingo passado. "Se o ano começa só depois do Carnaval, depois da folia e das férias, venha trabalhar conosco" dizia o informe publicitário. Em março, o número de candidatos que procuram a agência sobe 30%.
Os relacionamentos também se adaptaram ao calendário chinês. É depois do Carnaval que cresce a procura por agências de casamentos, lojas de noivas e cartórios. "O Carnaval está muito ligado a amores fugazes", lembra a "casamenteira" Márcia Goldschmidt. "Talvez por isso as pessoas nos procurem com tanta ansiedade após este período."
A busca por um parceiro fixo começa já na Quarta-Feira de Cinzas. "Recebemos 47 telefonemas depois de semanas em baixa", conta Márcia, dona da agência Happy End.
Entre os que procuraram agências de casamento depois do Carnaval está a estudante e promotora de eventos Luciene Cristina de Lima, 25. "Senti muita solidão nesses dias. Decidi que meu 96 vai começar diferente."
Para muitos, os projetos feitos no réveillon só agora começam a ser colocados em prática. De exames médicos a separações e terapias, tudo fica para depois das festas.
"As decisões são adiadas para mais tarde", afirma o psiquiatra e psicoterapeuta Luiz Cuschnir. "No Carnaval, muita gente veste a fantasia de quem não tem problema", afirma Oswaldo Rodrigues Júnior, do instituto de sexualidade H. Ellis, de São Paulo.
Depois da folia, o número de pacientes novos que procura o instituto aumenta 38%.
São Paulo também deixa de ser uma cidade "fantasma", em março. As pessoas voltam das férias, retomam suas atividades e tumultuam o trânsito. Cerca de 200 mil veículos voltam a congestionar a cidade, que tem uma frota circulante de cerca de 2,5 milhões de carros.
Os picos de lentidão chegam a dobrar. A previsão, segundo Paulo Vianna, supervisor de operações da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), é de que a soma dos trechos com trânsito lento no pico da tarde passe de 50 km para 100 km.
O "recomeço" do ano atrapalha o trânsito, mas deixa pelo menos dois setores aliviados: o comércio e o turismo. Em março, as vendas sobem em média 15%, e os hotéis recebem o dobro de hóspedes. "É um alívio chegar março", diz o presidente do Conselho de Hotéis de SP, James Akel.

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Sobre o início do "Ano Novo" às págs. 2 a 5

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