São Paulo, domingo, 25 de fevereiro de 1996
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De galinha a falcão

DALMO MAGNO DEFENSOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Novelas deixam o elenco extenuado. São meses trabalhando duro nos estúdios, capitalizando o sucesso da novela em peças de teatro e comerciais, e dando entrevistas no "Domingão" -estas, menos cansativas, pois Fausto Silva já inclui a resposta na pergunta, só restando ao artista dizer "sim".
É compreensível, por esses motivos, que a Globo raramente escale alguém para duas novelas consecutivas. O ostracismo planejado tem a vantagem adicional de evitar a superexposição, tão temida por gente "low profile" como os Mamonas Assassinas, Adriane Galisteu e Edmundo.
O arranjo é tão bem feito que nem o público fica "na mão". Graças às reprises de novelas, pode-se relembrar trabalhos da artista de quem se gosta, enquanto ela goza férias. Com sorte, o telespectador pode ver a "ídola" voltar à ativa antes do final da reprise, tendo dupla satisfação.
Em "Explode Coração", Regina Dourado é Lucineide, mulher de Salgadinho (Rogério Cardoso), mãe da teen temporã Sônia (Paula Lavigne) e de Edu (Cássio Gabus Mendes), rapaz introspectivo capaz de feitos inacreditáveis -como internetar a conta secreta de Júlio Falcão na França e resistir ao assédio de Rose (a internacional Paula Burlamaqui).
Regina faz o melhor humor de "Explode Coração". A prová-lo, há um monólogo de poucos segundos, no qual Lucineide, de tão furiosa com o marido, se esquece de falar em "carioquês" artificial e desanda a resmungar no carregado sotaque baiano de origem.
Em outra cena, durante visita de Júlio Falcão ao bairro de Maria da Graça, Lucineide encarna a parenta bem-intencionada, despachada e, em geral, fonte de grandes constrangimentos, da qual toda família possui um espécime.
Tentando convencer Júlio a arranjar uma "boquinha" para os filhos, a coruja Lucineide não economiza adjetivos ao descrevê-los. Soninha é apresentada como uma top-model nata, espécie de Claudia Schiffer hachurada, e Edu "é um Rui Barbosa, doutor".
Regina também pode ser vista na Bandeirantes, em "Cavalo Amarelo", de 1980. Ainda no começo da carreira, aparece pouco e ainda é menos ouvida no papel de uma vedete de teatro mambembe, tendo como chefes Dercy Gonçalves e Yoná Magalhães.
Regina volta à Globo no começo da tarde, na sangrenta "Renascer", de 1993. É Morena, mulher do jagunço Deocleciano (Roberto Bonfim), e transita pela Zona do Cacau em companhia de outros atores de "Explode Coração".
Teresa Seiblitz, à noite Dara, que tem romance com Júlio Falcão, às duas da tarde é Joana, casada com Tião Galinha.
Troca de ave e de ambiente entre os dois horários, mas, qual a Tigresa do Caetano, segue espalhando prazer e dor entre os homens (de Galinha e Lívio, em "Renascer", a Serginho, Igor e Júlio em "Explode Coração").
Entre as reminiscências, lá atrás da orelha, uma pulga: em toda carreira, há episódios que queremos esquecer. O alto executivo talvez não deseje rever-se no primeiro estágio profissional, na plenitude da ingenuidade e submissão, tirando xerox e comprando lanches para os graduados.
O veterano deputado, recém-aposentado pelo IPC, detesta recordar erros juvenis cometidos no início do primeiro mandato, há longínquos oito anos.
Resta saber, então, se as atrizes apreciam a exibição de cada item de seu currículo em rede nacional. Provavelmente sim, pois é natural nesse ofício, e não só nesse, um certo apego às vitrines. Além do mais, não é qualquer um que pode testemunhar a própria versatilidade e amadurecimento.

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