São Paulo, sexta-feira, 1 de março de 1996
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Elbrick traz informações do sequestro

CRISTINA GRILLO
DA SUCURSAL DO RIO

Valery Elbrick, 53, filha do embaixador norte-americano Charles Elbrick, já está se preparando para vir ao Rio acompanhar as filmagens de "O Que É Isso, Companheiro?", de Bruno Barreto, sobre o sequestro do pai em 1969.
"Nas próximas semanas estarei viajando. Vai ser bom acompanhar as filmagens da história de meu pai", disse Valery quarta à noite à Folha, por telefone, de Bethesda (nos arredores de Washington).
Valery contou que o sequestro abalou muito o pai. "Quando o reencontrei ele era um homem diferente. Era mais vulnerável, como se fosse o sobrevivente de uma grande catástrofe", disse.
Segundo ela, o pai comentava as conversas com os sequestradores. "Meu pai tinha certeza de que eles seriam mortos ainda muito jovens, se não logo após sua libertação", disse.
A filha do embaixador demonstrou surpresa ao saber que um dos participantes do sequestro, Fernando Gabeira, é hoje deputado federal (PV-RJ) e que outro, o jornalista Franklin Martins, dirige a sucursal do jornal "O Globo" em Brasília.
Valery também comentou a polêmica envolvendo o filme e os ex-sequestradores. Em entrevista à Folha na semana passada, Martins havia dito que o livro de Gabeira -que serviu de ponto de partida para o roteiro de Serran- "é uma mistura de ficção e realidade onde a realidade sai perdendo apesar de a ficção ser fraca."
"Pelas anotações que meu pai fez em seu exemplar do livro, tendo a achar que Martins tem razão", disse Valery.
Ela se refere a um exemplar de "O Que É Isso, Companheiro?", de Fernando Gabeira, no qual Elbrick fez algumas anotações. Numa delas, ele escreveu "wrong" (errado, em inglês), ao lado da afirmação de que teria recebido um livro de poesias de Ho Chi Min. Elbrick contou a Valery que recebeu de seus sequestradores um exemplar do "Livro Vermelho do Presidente Mao" de Mao Tse Tung.
Na época do sequestro Valery tinha 27 anos e morava em Belgrado, capital da Iugoslávia -onde seu pai havia sido embaixador antes de vir para o Brasil. Ela trabalhava como assistente de produção do filme "The Twelve Chairs", de Mel Brooks.
"Estava jantando no hotel quando recebi um telefonema da embaixada avisando que meu pai havia sido sequestrado. Jamais havíamos pensado nessa hipótese. Nunca um diplomata americano havia sido sequestrado", contou.
O choque foi grande. Valery lembra da época e de seu maior temor: nunca mais encontrar o pai vivo. Sua primeira decisão foi vir para o Rio, mas foi impedida.
"Todos estavam apavorados com os riscos para a segurança da família. Falei com minha mãe por telefone e ela me implorou para que não viajasse. Não havia como garantir minha segurança", disse.
Valery ficou ao lado do telefone durante os três dias e meio de duração do sequestro. "Hoje parece pouco tempo, mas aquele sofrimento não terminava."
O reencontro entre pai e filha aconteceu na semana seguinte em Washington. Valery conta que Elbrick mudou sua visão sobre a juventude e sobre o terrorismo.
"Ele passou a respeitar mais os jovens, a entender seus pontos de vista. Não é que ele tenha se tornado simpático à causa dos terroristas, mas aos jovens envolvidos, pela dedicação a uma causa."
Valery Elbrick, que hoje trabalha como produtora musical de uma orquestra em Washington, demonstrou surpresa ao ser informada pela Folha de que será convidada por Bruno Barreto a fazer uma "ponta" (participação em sequência pequena, sem falas) no filme. "Que ótimo. Não sabia disso. Vai ser muito interessante participar da história de meu pai."

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