São Paulo, segunda-feira, 4 de março de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Prestígio de Paraíso desbanca miseráveis

WILLIAM FRANÇA
ENVIADO ESPECIAL A PARAÍSO (TO)

Mesmo tendo 1.800 crianças fora de sala de aula e postos de saúde que só atendem duas vezes por se mana, a cidade de Paraíso do Tocantins faz justiça ao nome, quando comparada a seus vizinhos.
Município agrícola, o quinto em ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e com o menor índice de analfabetismo do Estado (6,1%), Paraíso tem os melhores índices sociais tanto no Mapa da Fome quanto no da Unicef.
O município, às margens da Belém-Brasília, é circundado por 14 municípios menores, numa espécie de pólo. Se tem déficits em saúde, educação, moradia e emprego, a situação dos vizinhos é bem pior.
Em alguns deles, como Barrolândia, Pium e Caseara, o sistema de saúde se resume a uma ambulância cujo destino é Paraíso.
O prefeito Manuel Torres (PPB) não esconde a alegria de ser um dos 12 atendidos pelo Comunidade Solidária no Estado. Sem isso, faltariam os 2.100 litros de leite que distribui por dia e as 1.401 cestas básicas que entrega regularmente, entre outros benefícios.
Amizade
Torres nega que Paraíso tenha sido incluído na lista do programa por razões político-eleitoreiras ou mesmo de amizade.
O prefeito é amigo do governador Siqueira Campos, também do PPB, há 27 anos. O governo estadual é o responsável pela indicação dos municípios do Comunidade.
"Não mexi nem uma palha sequer para entrar no Comunidade", disse o prefeito, em contradição com o seu estilo de trabalho.
Torres vive atrás dos governos federal e estadual para conseguir convênios, repasses ou parcerias.
Por meio da insistência, construiu seis escolas rurais e quatro colégios na cidade, creches e asilo, contratou professores, médicos e assistentes e assentou 735 famílias em terrenos com água e luz, antes do apoio do Comunidade.
Depois, obteve ônibus escolares e livros, além do leite e das cestas.
"Não se pode olhar para um mapa da fome desses daí (os levantamentos usados pelo Comunidade). Tem de olhar que a cidade fica num ponto estratégico", afirmou.
"Estamos erradicando a miséria dessa cidade. O Comunidade me ajuda e muito", disse o prefeito.
Mesmo sem estar na lista inicial do programa, que selecionou 15 outras cidades, Torres afirmou que Paraíso necessita de ajuda por ser a cidade mais próxima da capital, Palmas, a 62 km.
Maria Teresa Rocha, presidente do Comitê Executivo do Comunidade em Tocantins, diz que Paraíso foi incluída porque viveu um boom demográfico.
"Quando os mapas usados pelo Comunidade foram feitos, o Estado tinha 79 municípios e Paraíso 46 mil habitantes. Hoje moram lá pelo menos 60 mil, e Tocantins tem 123 cidades", disse.
Pindorama
O contraste com a felicidade de Jesus Torres pode ser encontrado a cerca de 200 km de Paraí do Tocantins, na cidade de Pindorama do Tocantins, a campeã de indigência do Estado, excluída do Comunidade Solidária.
Pindorama registra 46,9% de famílias indigentes. Em Paraíso, o índice cai a 21,3%. A primeira-dama de Pindorama, Zélia Ayres Arruda, nunca recebeu uma cesta de alimentos do programa.
"Aqui não tem nenhum médico nem hospital, temos apenas dois auxiliares de enfermagem", disse Zélia. "Não consigo entender porque escolheram Paraíso. Lá é cidade boa, tem de tudo", completou.
Pindorama é governada pelo PMDB, adversário do governador Siqueira Campos no Estado. "A política aqui no Tocantins ainda é muito selvagem", concluiu Zélia.

Texto Anterior: Escolha não é de Brasília, afirma Anna Peliano
Próximo Texto: Bahia lidera irregularidades
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.