São Paulo, segunda-feira, 4 de março de 1996
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Nada pelo social

JOSIAS DE SOUZA

São Paulo - Em seu primeiro ano de governo, Fernando Henrique investiu menos do que Sarney em educação e saúde -R$ 17,8 bilhões contra R$ 19,8 bilhões.
Os números, revelados em notícia da Folha de ontem, põem em cheque a alardeada prioridade social da atual administração. Há mais e pior, como demonstra outra reportagem, publicada hoje.
O Comunidade Solidária, vendido como programa modelo, não traz o selo de qualidade prometido por Ruth Cardoso. Longe de subordinar-se apenas a critérios técnicos, boa parte do investimento social atende a interesses políticos.
Há Estados em que, posto a serviço de partidos, o programa de Ruth Cardoso dá de ombros para as estatísticas. Deixa de lado comunidades comprovadamente mais necessitadas para atender à conveniência política.
Assim, se quisermos ser elegantes, podemos dizer que o perfil social-democrata do atual governo é uma utopia irrealizada. Ou, se desejarmos ser mais rudes, conversa fiada de sociólogo.
No campo social, como demonstrado, o primeiro ano de Fernando Henrique foi pior do que Sarney na forma (o volume de verbas) e muito semelhante no conteúdo (a fisiologia).
Há muito se diz que a ação social de Fernando Henrique é pífia. Tititi da oposição, dizia o Palácio do Planalto. Agora, porém, o calcanhar do governo começa a ser exposto em números e em fatos.
O governo costuma alardear que pôs fim à inflação. Uma meia-verdade. A guerra não acabou. E falta dizer o que faremos nesses tempos de estabilidade econômica além de dar dinheiro público a banqueiros falidos.
Quando bem-utilizada, a palavra é arma poderosa. Homero, por exemplo, ganhou um naco de eternidade ao compor sua Ilíada, recitada há mais de 2.700 anos.
Fernando Henrique considera-se um craque no manejo do verbo. O problema é que, ao contrário do vocábulo que faz o verso, a palavra de um presidente tem, cedo ou tarde, encontro marcado com os números.
Em matéria social, convém que Fernando Henrique fale menos e faça mais. Do contrário, pode até ganhar o seu pedaço de eternidade. Mas não será lembrado como um Homero da política.

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