São Paulo, sexta-feira, 8 de março de 1996
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INVENCIBILIDADE ROMPIDA

O governo perdeu, na quarta-feira, uma invencibilidade de 14 meses e cinco dias. Desde que assumiu, a 1º de Janeiro de 1995, a gestão de Fernando Henrique Cardoso não sofrera uma única derrota no Congresso.
De repente, de uma só vez, perde a batalha para evitar o número mínimo de assinaturas no requerimento para eventual instalação da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) sobre o sistema financeiro e vê derrotada em plenário a proposta do relator sobre reforma previdenciária.
São fatos suficientemente eloquentes, quaisquer que sejam as interpretações que se lhes queiram dar.
Mas seria precipitado imaginar uma crise política de proporções. Diferentemente do futebol, em que ganha quem marca mais gols, no jogo parlamentar às vezes ganha também quem tem menos votos.
Bastavam 27 assinaturas, em 81 senadores, para cumprir-se a exigência regimental para instalar a CPI para investigar o sistema financeiro.
No caso da Previdência, o governo teve o voto de 294 deputados, maioria absoluta da Casa, mas inferior ao quórum mínimo de 3/5 para reformas constitucionais.
O governo tem, portanto, margem para recompor-se da quebra de invencibilidade, apesar de constituir um fator psicológico relevante.
Para tanto, é forçoso que o Planalto reconheça ter caído em uma situação do tipo "se correr, o bicho pega; se ficar, o bicho come".
Se negocia com o Congresso Nacional, nos termos fisiológicos que são de nítida preferência de uma parcela substancial da Casa, será acusado de ser também fisiológico. Se não negocia, será acusado de prepotência e, pior ainda, poderá vir a acumular derrota sobre derrota.
Parece não haver saída, salvo lamentar que a política se faça assim. Mas, como não há hipótese de se importarem ministros da Holanda, deputados da Suécia e senadores da Alemanha (no pressuposto, talvez falso, de que nesses países o jogo seja muito diferente), o que resta é negociar.
O importante é delimitar os termos da negociação. O governo tem um projeto de reformas, e ninguém de bom senso dirá que o país não precisa de reformas, profundas aliás. O governo pode até fazer concessões, pode até admitir que mudanças na Previdência são mesmo difíceis de serem absorvidas pela população (do que dá prova o caso da França), mas não pode recuar a ponto de ou cancelar o seu ímpeto reformista, de resto já bastante atenuado, ou desfigurar as mudanças a ponto de torná-las inócuas ou até contraproducentes.
Enfim, requer-se um dose razoável, mas não exagerada, de "Realpolitik", sem a qual a quebra da invencibilidade pode ser a ante-sala de desastres maiores.

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