São Paulo, domingo, 10 de março de 1996
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Patrimônio foi formado na época colonial

FERNANDO MOLICA
DA SUCURSAL DO RIO

O historiador Riolando Azzi, 63, especialista na trajetória da Igreja Católica no Brasil, afirma que o patrimônio das grandes ordens religiosas que atuam no país foi formado principalmente durante o período colonial.
Segundo Azzi, as grandes ordens -como a dos carmelitas e dos beneditinos- receberam, ainda na época colonial, grandes doações do governo e de particulares. Estes, em testamentos, costumavam legar terras e escravos aos religiosos.
Azzi conta que os jesuítas chegaram a possuir muitos escravos e até navios para facilitar sua atuação comercial.
Autor de "História do Pensamento Católico do Brasil" (cinco volumes publicados pela editora Paulus), Azzi afirma que, apesar do patrimônio acumulado, é uma "utopia" falar em riqueza da Igreja Católica no país.
Segundo ele, apesar de seu caráter aristocrático e de algumas cerimônias pomposas, as dioceses brasileiras são pobres.
Mesmo a maioria das ordens religiosas sofreu, de acordo com ele, um processo de empobrecimento a partir da ascensão ao trono do imperador d. Pedro 2º, em 1840.
Na época, a religião católica era oficial e o imperador participava da administração da igreja. Segundo Azzi, os bispos e o clero eram funcionários públicos, subordinados ao Ministério da Justiça e Negócios Eclesiásticos.
O controle pelo Estado dos seminários e igrejas permitiu -ainda de acordo com o historiador- que d. Pedro 2º implementasse uma política de diminuição da maioria das ordens religiosas.
"Para ele, apenas as ordens dedicadas à educação eram úteis e mereciam ser incentivadas", conta.
Assim, por volta da metade do século 19, ordens como as dos carmelitas, beneditinos e franciscanos se viram impedidas de receber noviços -candidatos ao sacerdócio.
Laços quebrados
Três décadas depois, os religiosos remanescentes, já velhos, não foram capazes de administrar e preservar o patrimônio acumulado, que, aos poucos, foi sendo tomado por seus familiares, por meeiros e, em alguns casos, pelo Estado.
O incentivo às ordens dedicadas à educação gerou, segundo Azzi, um estímulo à abertura de escola -mesmo por religiosos não envolvidos com a atividade.
Com a República, em 1889, os laços entre religião e Estado são quebrados. Isso, de acordo com o historiador, garantiu maior espaço para a ação das ordens religiosas.
"Os educadores, como os jesuítas, maristas e salesianos, aumentaram suas redes de escolas, que tinham também a finalidade de garantir o sustento de outras atividades das ordens", diz.
Segundo Azzi, a Igreja Católica, de um modo geral, sempre foi contrária a práticas "capitalistas", nunca se preocupou com uma lógica empresarial.
"O princípio básico da igreja é o da esmola", afirma.
O clero era visto como responsável pela proteção espiritual do grupo -assim, merecia receber uma parcela de seus rendimentos.
Azzi diz que as agências de cooperação internacional ligadas à igreja têm origem no final dos anos 50, quando, assustado com a possibilidade de expansão comunista na América Latina, o papa João 23 fez apelos para a criação de mecanismos que aprofundassem a presença católica na região.
(FM)

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