São Paulo, quinta-feira, 14 de março de 1996 |
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Quem tem medo da CPI dos bancos?
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. Na discussão dos últimos meses sobre o sistema bancário e suas relações com o Banco Central (BC) veio à tona uma quantidade impressionante de problemas, denúncias e revelações.E, no entanto, poucas das questões levantadas nos meios de comunicação e no Congresso tiveram respostas que possam ser consideradas minimamente satisfatórias. Agora que se tenta bloquear a instalação da CPI, é preciso recordar algumas delas. 1) Como foi possível que o BC não detectasse a fraude praticada durante tantos anos pelo Nacional? A julgar pelo que foi divulgado, trata-se de uma das maiores falsificações já praticadas, envolvendo nada menos que R$ 5,4 bilhões, num total de 652 operações agora consideradas fictícias ou suspeitas! Qual a natureza precisa das deficiências da fiscalização do BC? Houve omissão ou conivência das diretorias do BC durante o longo período em que essas fraudes foram praticadas? Qual a responsabilidade dos auditores "independentes"? 2) Em depoimento no Congresso, em novembro último, o ministro da Fazenda afirmou que vinha alertando há tempos para o fato de que a queda da inflação exigiria ajustamento expressivo do sistema financeiro. "Com os bancos privados, não perdemos uma oportunidade, desde o final de 1993, para chamar a atenção sobre a necessidade de um ajuste", afirmou. Como se explica, então, que o governo não tenha se preparado para fazer face ao problema? Que providências foram tomadas para reforçar e modernizar a fiscalização do BC? Por que o governo demorou tanto para instituir um seguro de depósitos, já previsto na Constituição de 88? Por que o governo demorou a modificar a legislação de forma a ampliar a responsabilidade solidária dos sócios-controladores e sujeitar os seus bens à indisponibilidade? Essas duas últimas medidas só foram adotadas no calor da crise, depois do colapso de dois dos maiores bancos do país. 3) No mesmo depoimento, o ministro da Fazenda sustentou que em qualquer país do mundo recursos públicos são direcionados para o fortalecimento do sistema financeiro. Deu alguns exemplos; entre eles, o do Continental Illinois, nono maior banco dos EUA, que foi socorrido, em meados dos anos 80, "devido aos conhecidos impactos que a falência de um grande banco tem sobre o sistema como um todo." Pois bem: como explicar, então, a atuação do BC no caso do Banco Econômico, nono maior do Brasil? O BC desconhecia os "conhecidos impactos" que a quebra de um grande banco pode ter para o conjunto do sistema financeiro, especialmente quando há prejuízo para os depositantes? O governo reconhece que a maneira como lidou com o Econômico contribuiu para agravar a crise bancária e fragilizar a posição de outros bancos, particularmente o Nacional? 4) O governo ainda não prestou contas da negociação com o Unibanco, que resultou na cisão do Nacional. Têm procedência as denúncias de que o Unibanco teria obtido condições excepcionalmente favoráveis, tirando partido da situação dramática do Nacional e do nervosismo do BC, ainda traumatizado pela repercussão da crise do Econômico? 5) Em muitos países, a fiscalização bancária é compartilhada com outros órgãos públicos ou realizada fora do banco central. Nos EUA, por exemplo, o Federal Reserve compartilha essas tarefas com o Comptroller of the Currency, o Federal Deposit Insurance Corporation e os governos estaduais. Na Alemanha, a fiscalização é realizada fora do banco central. Diante do que tem acontecido, não seria o caso de modificar a localização institucional da fiscalização bancária no Brasil? 6) A eficácia e a credibilidade do BC têm sido prejudicadas pela percepção de que existe uma relação simbiótica entre os altos escalões do banco e interesses financeiros privados. A credibilidade do BC para atuar como emprestador de última instância não seria reforçada se fosse finalmente regulamentado o artigo 192, que estabelece, entre outras coisas, que lei complementar deve dispor sobre a designação de membros da diretoria do BC, bem como seus impedimentos após o exercício do cargo? Essas e muitas outras questões suscitadas ou ressuscitadas pelos escândalos financeiros recentes só poderão ser corretamente enfrentadas se for instalada a CPI dos bancos. O resto é conversa fiada. Texto Anterior: Momento infeliz; Braço avançado; Com precedentes; História vivida; Caixa preta; Há investimento; Novo nome; Ida ao exterior; Linha telefônica; Visão do xerife; Concentrando esforços; Em andamento; Novos negócios; Crise em análise; Efeito do Mercosul; Troca no comando Próximo Texto: O tamanho do escândalo Índice |
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