São Paulo, quinta-feira, 14 de março de 1996
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Corrupção e incompetência

LUÍS NASSIF

A crítica e a indignação devem ser encaradas fundamentalmente como elementos de transformação.
Cumpre-se esse papel quando a crítica é acompanhada de solução. A crítica pela crítica é instrumento de retaliação, sem a preocupação de mudar nada.
Além disso, há diferença fundamental entre a motivação do fato passível de crítica, e suas consequências.
Grandes desastres não se tornam menores se sua motivação for a incompetência -e não a desonestidade.
À luz desses conceitos, analise-se o caso Nacional.
Desde o ano passado, o Banco Central pratica política monetária irresponsável, que está provocando inutilmente os maiores índices de inadimplência, concordatas e falências nos pequenos e um aumento incalculável no endividamento público.
A coluna foi das primeiras a denunciar essa irresponsabilidade, que conseguiu produzir o feito recorde de um aumento no endividamento público explícito de mais de US$ 100 bilhões em apenas um ano.
Trata-se de irresponsabilidade profunda -mesmo sendo motivada pela incompetência.
Quando essa política foi inaugurada, com exceção dos jornalistas de maior independência -e dos setores que são contra em qualquer hipótese- essa irresponsabilidade foi saudada como o passaporte para o céu.
Com o tempo, a atuação burra e inflexível do BC, a arrogância do ministro da Fazenda e do presidente da República, provocaram ressentimentos cada vez mais generalizados da opinião pública.
O quadro econômico róseo cedeu lugar a um justo clima de ira, que aos poucos foi se infiltrando pela mídia.
Dólares e reais
Fosse o país mais racional, com objetividade um pouco maior do que o legado da tradição beletrista lusitana, esse ressentimento teria se convertido em pressão por mudanças objetivas, que ajudariam a amenizar esse massacre imposto aos pequenos.
Mas não. Há dois meses, o presidente do BC, Gustavo Loyola, anunciou um programa visando renegociar passivos dos pequenos. Nada fez.
Anda-se a passo de cágado nessa direção, porque o BC só age sob pressão. E ninguém está interessado em resolver a situação dos pequenos -nem governo, nem críticos.
Na terça-feira passada, o diretor do BC, Alkimar Moura, informou no Congresso que o aumento das reservas cambiais é positivo, pois se dá em cima de linhas de dólar para o setor produtivo.
Têm acesso a essas linhas apenas grandes empresas. Quando o BC adquire esses dólares, há uma expansão monetária.
Para contrabalançar, o BC reduz os recursos em reais, que serviriam de lastro para créditos domésticos para pequenas e médias empresas.
Ou seja, cada dólar que o BC autoriza para a grande corporação -e considera positivo-, ele desconta do crédito dos pequenos. E a cada mês que passa, com caso Nacional ou sem caso Nacional, aperta-se mais o torniquete sobre os pequenos.

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