São Paulo, quinta-feira, 14 de março de 1996
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OS SEM-NADA

A decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) de revogar a prisão preventiva de líderes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) deveria ser encarada como uma boa oportunidade para uma reflexão mais ampla sobre a questão.
Há, no Brasil, pelas contas do próprio MST, a serem comprovadas, cerca de 20 mil famílias em acampamentos precários. Por dolorosa que seja a situação dessas famílias, não é um número expressivo se comparado ao drama social mais amplo do país.
Basta citar, para comparação, os 32 milhões de brasileiros miseráveis, cifra que se tornou corrente a partir da campanha contra a fome do sociólogo Hebert de Souza, o Betinho.
Os sem-terra são, portanto, uma parcela dos sem-nada que políticas equivocadas ou injustas produziram ao longo dos anos, talvez séculos.
Pratica o MST, no entanto, uma estratégia de marketing muito bem conduzida, que desloca para essa parcela os holofotes da mídia, como se os demais não fossem igualmente dignos de atenção.
O mais elementar sentido comum dirá que não é por meio de invasões que se vai resolver nem a questão fundiária nem a dívida social mais ampla. Permiti-las é um convite para que os sem-indústria, sem-comércio, sem-dinheiro e demais despossuídos adotem as mesmas técnicas, o que obviamente levaria ao caos.
Da mesma forma, prender os líderes dos sem-terra tampouco resolve. Apenas aumenta o tamanho dos holofotes sobre o movimento.
Amplos e documentados dossiês publicados recentemente por esta Folha já demonstraram que os gastos sociais no Brasil não chegam a quem deles de fato necessita. Trata-se, pois, de reorientá-los, em primeiro lugar, para que sejam eficazes e, se ainda assim se revelarem insuficientes, aumentá-los.
É a única forma real de, a médio prazo, o país parar de fabricar os miseráveis que a todos preocupam.

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