São Paulo, domingo, 17 de março de 1996
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Paz doméstica

OSIRIS LOPES FILHO

A guerra fiscal está se agravando no país. Inicialmente, estava circunscrita a pequenos choques referentes à instalação, nos Estados, de estabelecimentos industriais de pequeno e médio portes.
A definição da Renault, de investir US$ 1 bilhão em uma fábrica de automóveis em Curitiba (PR), significou perda para São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, empenhados em puxar para si tal investimento.
A situação de beligerância tende a se agravar com a possível vinda para o país de outras montadoras de veículos.
Fábricas pioneiras dessas empresas, somadas às diversificações das montadoras já aqui, abriram campo para amplo leilão, em que cada Estado realiza o seu strip-tease tributário, com incentivos tributários e financeiros, tentando seduzir os investidores, dando mais do que pode.
A questão não é de falta de pudor. O ritmo e a densidade dos oferecimentos tendem a se acelerar pela concorrência. Os efeitos serão predatórios para a estabilidade da Federação e acentuarão a fragilidade dos Tesouros estaduais.
Ao governo federal cabe criar uma política industrial para o país. Discuti-la com governos, investidores, comunidade, e fixar o planejamento para a implantação de novas indústrias, e diversificação e ampliação das existentes. É o processo civilizado de expansão industrial.
A proposta de reforma tributária do governo federal encerra solução para a guerra fiscal: a criação do ICMS federal e estadual, com a União legislando sobre ambos. Isso pode pôr fim à guerra fiscal. Ou, pelo menos, discipliná-la. Mas destrói a autonomia estadual, base da Federação. É uma solução cavalar.
Há na Constituição possibilidade menos traumática de remediar a situação. Seria a viabilização do artigo 146, inciso 1, de, mediante lei complementar, disciplinar os conflitos de competência, em matéria tributária, entre os membros da Federação. E também baixar as leis complementares previstas para o ICMS. Têm faltado vontade política e engenho para tanto.
Mas é mais oportuno ao governo federal pacificar a beligerância interna, que compromete o equilíbrio da Federação, do que levar diante sua ambição de sentar-se permanentemente no Conselho de Segurança da ONU, para cuidar da paz mundial.
Na época da globalização, é prudente ter o pé no chão. Muitas viagens de avião, pela proximidade das nuvens, nas alturas, pode acarretar que se faça uma política nefelibata.

Osiris de Azevedo Lopes Filho, 57, advogado, é professor de Direito Tributário e Financeiro da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.

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