São Paulo, domingo, 17 de março de 1996
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A cobrança do ITR de 1995

SÍLVIO TORRES

O Imposto Territorial Rural (ITR) tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel localizado na zona rural em 1º de janeiro.
A sua base de cálculo é o valor da terra nua (VTN), apurado em 31 de dezembro do ano anterior, que corresponde ao valor do imóvel menos o das construções, instalações e benfeitorias, culturas permanentes e temporárias, pastagens cultivadas e melhoradas, bem como florestas plantadas.
Como vemos, tendo por base o valor da terra nua em 31 de dezembro, calcula-se o imposto a ser pago no ano seguinte.
Com a edição da lei 8.022, de 1990, ficou a cargo da Receita Federal a administração do ITR, o que compreende a sua arrecadação e fiscalização e os serviços de cadastramento das propriedades rurais.
Para o recadastramento de 1992, a Receita Federal orientou os contribuintes para que considerassem como valor da terra nua o valor de mercado do imóvel em 31 de dezembro de 1991.
A cobrança do imposto de 1992 e 1993, segundo essa orientação, foi plenamente absorvida pelos contribuintes, que não sentiram em seu bolso o valor do tributo a pagar, porque até então a legislação era mais benéfica e concedia incentivos fiscais de redução de até 90% do ITR para as propriedades que efetivamente eram exploradas.
Note-se que se incentivava a propriedade efetivamente explorada.
Em 1994 foi editada a lei nº 8.847, mudando a sistemática anterior e eliminando praticamente todos os incentivos à exploração da terra.
Realizou-se novo recadastramento, tendo os valores da declaração sido transformados em Ufir (Unidade Fiscal de Referência), índice que passou a indexar todos os tributos federais. O valor da terra nua, assim, passou a ser corrigido automaticamente, com base em um índice de inflação.
Além disso, a Receita Federal adotou providência para evitar que os valores declarados pelos contribuintes fossem subestimados, fixando valores mínimos da terra nua e, em consequência, do imposto. Só seriam aceitos valores declarados acima do mínimo fixado.
Houve nova modificação para o lançamento do ITR de 1995. O valor da terra nua foi estabelecido com base em pesquisa realizada sobre os preços de mercado entre junho e dezembro de 1994, o que acarretou significativo aumento do imposto.
Esse o motivo por que a cobrança do ITR de 1995 vem provocando uma verdadeira revolta dos agricultores paulistas. As justas reclamações decorrem dos reajustes absurdos verificados em relação a 1994.
São comuns os casos de aumentos de 200%, 300%, 400% e até de 800% em todo o Estado de São Paulo e, acredito, em todo o Brasil.
Esses elevados percentuais se mostram desproporcionados à inflação do período, abaixo de 25%. Tais aumentos no valor do imposto têm uma explicação lógica, fornecida pela Receita Federal, mas não se justificam.
Entre a pesquisa para fixação dos valores mínimos do VTN e o lançamento do imposto decorreu mais de um ano, tempo em que ocorreram significativas transformações na economia e, particularmente, na agricultura, que influenciaram negativamente o preço da terra.
O preço do alqueire de terra em São Paulo chegou a cair mais de 60% no decorrer de 1995. Assim, passamos a ter uma base de cálculo do imposto superestimada, onerando injustamente o contribuinte.
É notória a situação de inadimplência dos agricultores, de Norte a Sul do país, em face dos juros elevados, frustração de safras, alta nos preços dos insumos e baixa nos dos produtos.
Além disso, o aumento do ITR é conflitante com a política de desoneração da agricultura, desenhada na proposta de reforma tributária do Poder Executivo (PEC 175).
Nesse quadro adverso, a apresentação da notificação do imposto, em janeiro de 1996, com um ano de defasagem, pegou os agricultores descapitalizados e endividados, os preços das terras reduzidos significativamente e os negócios com terra praticamente paralisados.
Assim, as reclamações dos agricultores tendem a transformar-se em impugnações em massa, tanto na via administrativa quanto na judicial, com perspectivas de soluções demoradas, em prazos nunca inferiores a uns cinco anos.
Esse quadro não interessa ao fisco, não só porque postergará a arrecadação do tributo, mas também porque milhares de processos exigirão o deslocamento de funcionários de suas atividades normais, acarretando elevados custos administrativos.
Corrigir essa situação é medida de bom senso e de justiça.

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