São Paulo, segunda-feira, 18 de março de 1996
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Por que revitalizar o Proálcool

LAMARTINE NAVARRO JUNIOR

O petróleo está em extinção. Com a atual demanda, as reservas serão consumidas nos próximos 50 anos

Em termos de importações de petróleo, o resultado obtido em 20 anos, com economia de US$ 28 bilhões, versus a aplicação de US$ 10 bilhões, demonstrou o acerto do plano, ressaltando-se a característica de renovabilidade, que permite assumir indefinidamente a economia anual resultante do volume de petróleo de 220 mil b/d hoje substituídos. Como resultados adicionais, ressaltamos:
A criação na área rural de 1 milhão de empregos, utilização dos fatores ociosos de produção, desenvolvimento tecnológico dos motores a álcool, correção do índice de octanagem da gasolina, extinção do uso do chumbo tetraetila e desenvolvimento tecnológico da produção de cana, açúcar e álcool, com ganhos de produtividade da ordem de 3% ao ano. E mais:
A recolocação do Brasil em posição de destaque no mercado internacio nal do açúcar e os benefícios ecológicos obtidos com o uso do álcool, por ser menos poluente. No plano internacional, muitos países estão seguindo o exemplo e vários programas de substituição de combustíveis fósseis por renováveis estão em andamento.
Destacamos o programa dos EUA, com a mistura de 10% de álcool na gasolina, iniciada na década de 80, posteriormente regulamentado pela Lei do Ar Limpo no governo Carter, evoluindo com a criação da coalização de governadores pró-etanol, e recentemente consolidado com o lançamento dos veículos Taurus E-85 da Ford e S-10 da GM, com motores de última geração que operam com combustível flexível.
Extensa rede de postos está sendo equipada para oferecer o combustível do não-poluente E-85, mistura de 85% de etanol com 15% de gasolina.
A produção americana de etanol já atingiu, em 95, 6 bilhões de litros, e face aos custos de produção do álcool de milho e o atual crescimento da demanda, configura-se promissor mercado para o etanol brasileiro naquele país. Programas semelhantes vêm sendo desenvolvidos na Comunidade Européia, notadamente na França, Suécia, Alemanha e Itália.
Todo esse processo de substituição de combustíveis fósseis por renováveis tem por base duas verdades:
1) O petróleo está em fase de extinção e, mantendo-se os atuais índices de demanda, as reservas de extração econômica serão consumidas nos próximos 50 anos. É fácil prever que o aumento do consumo, aliado a queda na oferta e aos maiores custos de extração, resultará no aumento do preço do petróleo e, assim, o ritmo de sua substituição por outros combustíveis será acelerado.
2) A consciência ecológica, cada vez mais arraigada principalmente no Primeiro Mundo, exige um controle da geração de CO2 e também limites cada vez mais restritos na composição dos gases de exaustão dos veículos, o que aponta o etanol como uma das mais importantes alternativas para as frotas automotivas do próximo milênio. Por isso nos encontramos em uma encruzilhada histórica.
Não existe nenhum outro país no mundo com as mesmas condições do Brasil para produzir etanol.
Temos clima favorável, 350 milhões de hectares de área agricultável não utilizada, ampla oferta de mão-de-obra e ainda lideramos a tecnologia de produção.
Por isso ou o Brasil define medidas que garantam a continuidade do Proálcool, e se coloca na liderança internacional do processo de substituição de combustíveis fósseis, ou paralisa e extingue o seu programa, como vêm fazendo, e se encaixa no contexto dos países sem energia e sem futuro.
Não existem meias soluções. Um parque de produção alcooleira não se constrói em dois anos, apesar de ser facilmente destruído em um ano.
Além da falta de suporte dos últimos dois governos, o Proálcool atualmente é vítima do efeito de duas variáveis da política macroeconômica: a taxa de câmbio, que sobrevaloriza a moeda nacional, e a taxa de juros real, excessivamente elevada. A taxa de câmbio é responsável por preços aparentes de derivados de petróleo muito baixos, e a taxa elevada de juros afeta perversamente o resultado de uma atividade de produção sazonal.
É preciso entender que comparações entre preço atual do petróleo e os custos econômicos do álcool carecem de sentido. O álcool não é gasolina -é um combustível muito mais nobre, ecológico e renovável-, e os atuais preços do petróleo refletem somente a curta visão de empresas buscando resultados financeiros a curto prazo, sem qualquer preocupação com o futuro. Em termos macroeconômicos, o balanço real da produção de álcool é altamente favorável.
O atual preço do petróleo, da ordem de US$ 17 por barril, é fictício porque não inclui o valor das suas externalidades: custos de segurança de transporte e da instabilidade política do Oriente Médio, os inerentes à natureza finita do petróleo e o atual estágio das reservas mundiais, os provocados pelo alto poder poluidor do petróleo.
Do outro lado, no preço do álcool é preciso deduzir suas externalidades: A economia direta do petróleo substituído e o aumento das reservas, o valor da renovabilidade do combustível, o resultado do uso dos fatores de produção ociosos, aumento do PIB, geração de empregos, tendência de redução dos custos de produção, o valor dos benefícios ambientais e a abertura de mercados externos.
Tudo indica que o Brasil deveria revitalizar a produção de álcool e poupar suas reservas de petróleo para uso estratégico em épocas mais oportunas. Se, ao contrário, paralisar o programa, o vetor que hoje impulsiona o álcool em termos internacionais perderá sua aceleração. E estaremos fechando a porta que poderia colocar o Brasil no contexto das maiores economias mundiais.
Por todos esses motivos é preciso uma solução definitiva para o Proálcool -hoje o álcool é um programa de governo- e, assim, cabe ao Estado determinar seus objetivos de forma clara e definitiva, evitando o caos que está ocorrendo no setor produtivo.

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