São Paulo, terça-feira, 19 de março de 1996
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Tamanho jumbo

JANIO DE FREITAS

Ainda encharcada pelo banho de desgaste que levou com os negócios em torno do Sivam, a Aeronáutica está prestes a envolver-se em mais negócios injustificáveis. Outra vez por se deixar associar a interesses lobistas localizados na Presidência da República.
O noticiário que apresenta os Boeings 707 da Presidência (os aviões usados nas viagens internacionais) como ferros velhos é fabricado no Planalto. A autoria do apelido de sucatão, dado a cada um dos dois aviões, é atribuída ao próprio Fernando Henrique.
Como William França informou na Folha de ontem, a Presidência da República pediu à Aeronáutica a coleta de propostas para o leasing de dois Boeings 747, o modelo conhecido como Jumbo. A Presidência apresenta a transação como "aluguel", e não compra. É tapeação. Dados os preços altíssimos dos aviões de maior porte, que nenhuma empresa aérea se disporia a pagar à vista, o "leasing" é a modalidade de venda adotada, e não de hoje, para tais aviões. Esse tipo de transação não alterou as comissões de intermediários dos negócios, que são feitos da mesma maneira com fabricantes ou companhias aéreas.
Os preços dos aviões dependem da configuração interna que o comprador deseje. Mas pode-se estimar, sem exagero, que cada um dos Jumbos desejados pelo presidente Fernando Henrique não custe menos de USŸ 100 milhões, o que levaria a compra dupla para o dobro.
Não haveria gasto mais perdulário do que esse, com aviões imensos (normalmente, para cerca de 400 passageiros) e definitivamente desnecessários. Nem a megalomania desvairada justificaria tal negócio: a ela seria necessário acrescentar um dose de leviandade descomunal.
Nem os atuais 707 se justificam. Para o presidente de um país assoberbado por problemas graves, Fernando Henrique viaja muito mais ao exterior do que se esperaria de um presidente responsável. Mas, para um 707, e para um 747 nem se fale, é quase como se nem viajasse. A posse e manutenção desses aviões custa o diabo aos que pagamos impostos para, em relação à sua potencialidade, ficarem no chão.
Até anos recentes, os presidentes brasileiros voaram em aviões fretados a companhias aéreas. E sempre obtiveram os melhores resultados em termos de viagens e de custo para os cofres públicos. Os presidentes europeus viajam todos em aviões de companhias dos respectivos países. O Brasil tem hoje três companhias fazendo vôos internacionais em igualdade de condições e, portanto, igualmente habilitadas a proporcionar vôos exclusivos a qualquer presidente, com as mais confortáveis acomodações. E a custo muito menor do que a compra (ainda que por leasing) e a manutenção de aviões que uma Presidência decente não deve ter.
Se for para termos Jumbos à espera de Fernando Henrique, então digamos logo que isso é negócio e negócio tamanho jumbo.

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