São Paulo, terça-feira, 19 de março de 1996 |
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Compositor funde pop e poesia
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
Riquíssimo em melodias e arranjos, o disco não faz sentido sem as letras. Lou se mostra cada vez mais acurado como exímio construtor de imagens pela palavra. Em "The Proposition", por exemplo, Lou prega a equivalência apriorística entre todas as coisas, aceitando-as simplesmente. Profere que, "da mesma forma que Aids precisa de uma vacina, em algum lugar uma vacina precisa de Aids". Parece ser o primeiro artista a classificar o vírus HIV como mero agente natural, e não praga divina à espera de anjos redentores (à moda de Tony Kushner) ou mórbido canalizador de culpas (como o Jonathan Demme de "Filadélfia"). Não se pense com isso que a música é irrelevante no disco, farto aliás em surpreendentes melodias, como em "Finish Line", dedicada ao colega de Velvet Sterling Morrison, morto em 1995. Exemplo maior é "NYC Man", um verdadeiro espanto: começa com gotas estilizadas de chuva, que se transformam num delicado soul à Motown perpassado pelo canto-fala de Lou; aí, namora a dance music de Neneh Cherry, esbarra nas gaitas folk de Bob Dylan -sem gaitas- e cita Shakespeare em batida de rap, para desaguar em estilizadas buzinas de carro na madrugada de Nova York, que ele ama. E há a arte. "Trade In" reprocessa Warhol, casando música, letra e projeto gráfico: os versos, no encarte, deslizam pela foto do rosto de Lou, decadente, precocemente envelhecido, ainda retendo traços de perversidade. As palavras que correm em seu rosto expõem a divisão da persona de Lou em duas, uma morta e outra recém-nascida. Declara-se um "novo homem", renascido das cinzas do outro que acaba de fenecer. Mas Lou continua o mesmo, tão incisivo quanto o jovem transgressor de 1967. (PAS) Disco: Set the Twilight Reeling Artista: Lou Reed Lançamento: Warner (importado) Onde encontrar: Lado A (tel. 011/258-5911) Texto Anterior: Os "dinossauros" Lou Reed e Iggy Pop voltam à cena Próximo Texto: Roqueiro dá banho em nova geração Índice |
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