São Paulo, domingo, 24 de março de 1996
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Nordeste tem 'Polígono do analfabetismo'

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
DA REPORTAGEM LOCAL

Professores leigos e mal pagos e escolas sem infra-estrutura são alguns dos fatores que separam o "Polígono do analfabetismo", no Nordeste, da região do "Oscar da alfabetização", no Sul.
Em taxa de analfabetos, são regiões tão distantes quanto Serra Leoa, na África, e o Canadá, na América do Norte.
Em cada uma dessas áreas, dois grupos de 29 cidades ostentam as piores e as melhores taxas de adolescentes analfabetos no Brasil. São jovens de 15 a 17 anos que, em geral, frequentaram a escola, mas não sabem ler nem escrever.
Num raio de 250 km em torno de São José da Tapera (Alagoas), concentram-se 29 dos 50 municípios brasileiros que têm, proporcionalmente, mais jovens analfabetos. Juntos, formam o "Polígono do analfabetismo", uma analogia com o "Polígono da seca".
Cerca de 3.500 km ao sul, reúnem-se, coincidentemente, 29 das 50 cidades que merecem o "Oscar da alfabetização" no Brasil. Lá a taxa de adolescentes alfabetizados oscila entre 100% e 98,72%. A região é a mesma da história de "O Quatrilho" -indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro.
Ranking
As duas áreas foram identificadas pela Folha a partir de um estudo do Unicef. O Fundo das Nações Unidas para a Infância usou o Censo de 91 e classificou as 50 piores e as 50 melhores cidades em taxa de analfabetismo de adolescentes.
Um programa de computador (Atlas GIS) facilitou a localização das cidades (algumas com pouco mais de mil habitantes) no mapa e a identificação das regiões onde elas se concentravam.
O ranking do Unicef será a base de uma campanha de mobilização a ser lançada pelo governo federal e que pretende combater o analfabetismo em 50 cidades.
Entre o sertão e a Zona da Mata, as cidades do polígono se distribuem por Alagoas (15 municípios), Bahia (8), Pernambuco (4), Paraíba (1) e Sergipe (1).
A taxa de analfabetismo adolescente entre essas cidades varia de 72,79% a 54,18%.
Só em países africanos como Nigéria, Etiópia e Serra Leoa, ou da Ásia meridional, como Bangladesh, é possível encontrar taxas semelhantes. Mesmo assim, em comparação ao índice de analfabetismo geral da população adulta.
A região do polígono é das mais pobres do Brasil. Com a falência da economia algodoeira e, mais recentemente, de usinas de açúcar e álcool, as maiores fontes de renda são os repasses federais. Há um pouco de pecuária e plantações de milho e feijão para subsistência.
Há 22.406 adolescentes analfabetos no polígono, numa média de 773 por cidade. A taxa média de analfabetismo, de 58%, é quatro vezes maior do que a nacional.
Terceiro no ranking do Unicef e "primeiro" da região, o município de Pedro Alexandre (Bahia) tem professores como Salete de Menezes. Com apenas um ano de estudo, ela dá aula até a 4ª série. Seu salário: R$ 23 por mês. A escola funciona em sua casa, de taipa.
Oscar da alfabetização
As 29 cidades que formam a região do "Oscar da alfabetização" se estendem pela serra gaúcha e pelos vales dos rios Caí e Taquari.
Em comum, além de serem todas gaúchas, têm a colonização italiana e alemã. Quatro delas não têm nenhum adolescente analfabeto.
As 221,8 mil pessoas vivem em comunidades de, em média, 7.300 habitantes.
Ao todo, há só 88 adolescentes analfabetos -segundo o Censo de 91-, numa média de três por cidade. Os problemas sociais são escassos, e a economia é agrícola, baseada nas pequenas propriedades.

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