São Paulo, terça-feira, 26 de março de 1996
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Justiça Militar não é isenta, diz juiz

DANIEL BRAMATTI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Um relatório confidencial da Justiça Militar de Minas Gerais, obtido com exclusividade pela Folha, revela que seus próprios integrantes reconhecem a falta de isenção dos tribunais militares.
O documento, datado de junho de 1989, avalia o risco de desmoralização da Justiça Militar, caso sejam tornados públicos aspectos que interferem e paralisam os processos ali conduzidos.
Seu autor -o juiz, coronel e ex-presidente do TJM mineiro Laurentino de Andrade Filocre- ressalta problemas como impunidade, lentidão, parcialidade e improdutividade.
"Estou convencido de que, se certos fatos da nossa intimidade chegarem ao conhecimento público, não haverá força de argumento capaz de salvar este tribunal da extinção e, pior, da desmoralização", escreveu o coronel.
O texto é endereçado ao juiz Luís Marcelo Inacarato, então presidente do Tribunal de Justiça Militar. O cargo foi ocupado depois pelo próprio Filocre, do início de 1994 até o último dia 11.
A ameaça de extinção dos tribunais militares ganhou força no final de janeiro, com a aprovação, na Câmara, do projeto do deputado Hélio Bicudo (PT-SP) que restringe a competência da Justiça Militar aos crimes cometidos dentro dos quartéis. Hoje, vai para a Justiça Militar qualquer crime cometido por membro das Forças Armadas ou PM, em serviço ou fora, bastando apenas que seja usada uma arma da corporação.
Com menos processos para julgar, os tribunais militares ficariam "esvaziados", o que reforçaria os argumentos daqueles que defendem sua eliminação.
O ministro Nelson Jobim (Justiça) e um de seus principais defensores do projeto de Bicudo.
Processo
Sete anos após as críticas ao corporativismo dos tribunais militares, o próprio juiz Laurentino de Andrade Filocre está sendo acusado de "conluio corporativista".
O autor da representação, redigida em 5 de março, é o juiz Luís Marcelo Inacarato -o mesmo destinatário do relatório de 89.
Inacarato acusa Filocre de "pressionar juízes" e "tentar interferir em processos" durante o período em que foi presidente do TJM. Para Inacarato, as pressões corporativistas "ocorrem com frequência".
A testemunha-chave do processo é o juiz-auditor Jadir Silva -que é civil-, da 3ª Auditoria Militar de MG.
Ele prestou uma declaração em cartório no dia 28 de fevereiro, denunciando ter sido "censurado em alto tom" pelo então presidente do tribunal (Filocre), por causa de duas sentenças em que soldados foram absolvidos da acusação de desacatar superiores.
As sentenças irritaram o comandante geral da PM, que enviou dois ofícios ao tribunal. Ao receber os ofícios, Filocre convocou Jadir Silva a se explicar.
"Houve uma interferência inaceitável da cúpula da PM e do presidente do tribunal sobre o juiz", disse o autor da representação.

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