São Paulo, quinta-feira, 28 de março de 1996
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O preço da Light

LUÍS NASSIF

A venda da Light sai ou não? Eis a questão.
Na primeira etapa do programa de privatização, o governo baixou artificialmente os preços, por meio da manipulação do fluxo de resultados das empresas e da permissão para o pagamento com as chamadas "moedas podres".
Desta vez, a privatização da Light baseou-se em avaliações rigorosas de preço, eliminando todos os vícios iniciais.
A questão básica -que só terá resposta no dia do leilão- é a seguinte: haverá comprador?
Confira os resultados desse jogo.
1) Suponha uma estatal que tenha um lucro projetado de 10 ao ano, nos próximos dez anos.
2) Privatizada, ela ganhará no mínimo 25% de produtividade. Ou seja, seu lucro líquido pulará, por hipótese, para 12,5 ao ano.
Em cima da estimativa de resultados, o avaliador inclui uma taxa de juros que lhe permita calcular o valor presente da aplicação.
Ou seja, quanto o investidor precisaria aplicar no mercado, com a taxa de juros utilizada, para obter os mesmos resultados que teria comprando a empresa.
Se se calculasse o valor da companhia pelo lucro que ela passaria a gerar, depois de privatizada (12,5 ao ano), a uma taxa de desconto da ordem de 10% ao ano, se chegaria a um total de 76,8.
O que se fazia
Providência 1 - Considerava-se que a companhia continuaria gerando os mesmos 10 de lucros.
O preço caía para 61,5 -ou 20% a menos.
Providência 2 - Aumentava-se a taxa de desconto para 18% ao ano.
O preço caía para 44,9 -41% a menos.
Providência 3 - Permitia-se o pagamento em moedas podres, com 50% de deságio.
O preço final caía para 22,5 -71% a menos.
Se o investidor pagou 22,5 e a empresa rendeu 12,5 ao ano, sua rentabilidade com a operação não foi nem de 10% nem de 18% -mas de 55% ao ano.
180 graus
Com a Light, inverteu-se o jogo. Incorporaram-se nas projeções de fluxo os ganhos de produtividade advindos com a privatização; considerou-se uma taxa de desconto de 10% ao ano; e obrigou-se o pagamento exclusivo em dinheiro. Ou seja, 10% ao ano ficou 10% mesmo.
O que os investidores alegam é que, com o custo de captação do Brasil no exterior estando em 12% a 14%, 10% de taxa de desconto real seria excessivo.
E a permissão de utilização de 20% do pagamento em modas podres não refrescará a situação -para eles, significará redução de 10% no valor do controle da companhia.
Esses investidores pleiteiam que a taxa de desconto seja elevada para 14%, o que reduziria o preço total da Light para R$ 3,6 bilhões -uma redução de 37%, segundo suas contas (não se sabe como chegaram a essa conta, já que um fluxo de dez anos, a 14% ao ano, significaria redução de 18% no preço final em relação à taxa de 10% ao ano).
Segurança
O que está por trás dessa discussão, no fundo, é a falta de regulamentação do setor elétrico.
Com garantias expressas -oferecidas pela regulamentação- cessaria o potencial de risco da operação e taxas de 10% ao ano até poderiam ser razoáveis, já que o setor elétrico é bastante estável.
Inclusive, aumentaria sensivelmente o número de candidatos à compra, permitindo ao BNDES uma exigência que não consta do edital: a de os compradores se comprometerem com um programa de investimentos de R$ 1 bilhão, necessário para recuperar a companhia.
Sem a regulamentação, e mantendo os atuais critérios, pode ser que o leilão resulte em decepção.

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