São Paulo, terça-feira, 2 de abril de 1996
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Procura-se um síndico

NEY LIMA FIGUEIREDO

Embora possa parecer ilógico, o importante no início de qualquer campanha política não é o dado bruto das pesquisas quantitativas. Saber quem está na frente, quem subiu e quem caiu ajuda muito pouco.
Os dados de uma pesquisa quantitativa, que é uma fotografia de um determinado momento, devem ser analisados no contexto político no qual são levantados, sendo que as pesquisas qualitativas é que vão explicar a motivação do voto.
Em algumas cidades, como São Paulo, candidatos a candidato exibem pesquisas de opinião para convencer os seus companheiros de partido que são a melhor opção, já que lideram a preferência popular, como procurou fazer crer Luiza Erundina na sua disputa contra Aloízio Mercadante, no PT.
Na verdade tais levantamentos têm muito pouco peso eleitoral.
No início de uma campanha uma melhor posição no ranking das pesquisas pode apenas indicar que o candidato X é mais conhecido que o candidato Y, sem isso significar que ele seja o nome de preferência dos eleitores.
Nesse momento o mais importante é saber quem faz o perfil que os eleitores desejam para resolver os inúmeros problemas da comunidade.
Isso ocorre em toda e qualquer eleição: existem anseios e frustrações dos eleitores que ensejam um espaço a ser preenchido por um candidato que faça um determinado perfil.
Fernando Henrique, em 94, ofereceu a estabilidade econômica e financeira que o povo tanto queria. Em 92, em São Paulo, Maluf apresentou-se como tocador de obras e grande conhecedor dos problemas municipais.
Em 96, a história não vai ser diferente.
Nas eleições municipais o eleitor vota com maior consciência. O município reveste-se de grande especificidade, caracterizada pela prevalência de problemas de ordem técnica e administrativa sobre os de ordem política.
Segundo levantamentos do Ibope, analisados pelo Cepac há pouco tempo, a maioria dos eleitores considera que os principais aspectos da administração pública, mais diretamente relacionados à sua existência cotidiana, deveriam achar-se sob a gestão das prefeituras, tais como: moradia, saúde, segurança, trânsito, ensino.
O eleitor hoje tem boa noção de quais são as funções dos governantes em todos os níveis: presidente, governadores e prefeitos. Não adianta querer inverter a agenda. O candidato que pretender transformar em plataforma de campanha problemas macroeconômicos, como Plano Real, flexibilização de direitos trabalhistas, reforma constitucional vai dar com os "burros n'água".
O eleitor quer saber quais são as propostas em relação aos problemas da comunidade, como enchentes, coletas de lixo, saneamento básico, buracos de rua, trânsito, valor do IPTU etc. Não adianta falar de temas que a sociedade sabe que não são da alçada do prefeito.
Com a prática do voto o eleitor está escolhendo cada vez com mais consciência.
Ele espera que o candidato a prefeito, além de conhecer profundamente os problemas do município, tenha um compromisso com o Estado de Direito, impedindo a invasão de terras e bens públicos, preservando o meio ambiente, impedindo o aumento de favelas e removendo as já existentes, prevenindo os deslizamentos das encostas dos morros, controlando feiras clandestinas e camelôs que atravancam o trânsito pelas calçadas e tendo um plano eficiente contra as chuvas, que ano após ano infernizam a vida das cidades, embora tenham data certa para chegar.
O PT, especialmente, tem de jogar fora o seu discurso ideológico se quiser ter alguma chance. Falar contra o liberalismo, atacar a concentração de renda, pregar contra a política do governo FHC tachando-a de recessiva e protetora de banqueiros não vai eleger ninguém.
O povo quer um síndico para resolver os problemas do município e não um tribuno para discutir os grandes temas nacionais.

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