São Paulo, segunda-feira, 8 de abril de 1996
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Martins expõe a intuição das formas desdobradas da escrita

Exposição abre amanhã no Espaço Higienópolis

KATIA CANTON
ESPECIAL PARA A FOLHA

Poeta-ensaísta, gravurista-escultor, Alberto Alexandre Martins não vê diferença na essência desses afazeres. Suas obras, expostas a partir de quarta-feira no Espaço Higienópolis, funcionam como uma tese sobre a arte como desdobramento da escrita.
Para o artista plástico, o ato de gravar, seja na madeira ou no metal, assim como o de escrever, produz riscos, que tomam corpo como signos a serem decifrados.
Pois suas obras têm uma obsessão com os riscos. Mais do que isso, os riscos, somados a uma dose de impulsividade do fazer artístico, se tornam cortes.
Tudo isso começou em 1981, quando Martins venceu um salão de arte em Santos, com um simples desenho. Figurativo, meio ingênuo, feito com uma Bic, mesmo.
Essa pontaria e atração pelo risco ele levou para a gravura. Primeiro tentou o metal, mas acabou atraído pela madeira. Desde 1986 dedicou-se exclusivamente à xilogravura, sempre executada somente em preto e branco.
Influenciado por Evandro Carlos Jardim a pensar o meio em profundidade, Martins passou a matutar mais e mais sobre os tais cortes e sulcos. Até incorporá-los às esculturas.
Suas esculturas também são pretas, como os volumes das xilos. O conjunto das obras -austero na restrição a pretos e brancos, quase minimal na síntese das formas- torna-se apetitoso para relações com outros artistas abstratos. Por exemplo, Eduardo Chilida e Richard Serra.
Algumas gravuras da mostra, exibindo uma grossa massa de tinta preta saltando do papel, de fato se relacionam com o universo de Serra. Martins criou-as a partir da imagem de navios enormes, atravessando o porto de Santos, tapando a visão. Coincidentemente, Serra também utiliza essa noção em suas obras.
Mas é bom lembrar que o importante, para Martins, não é a forma, mas sim a tensão. Tensão ele chama o ato de arrancar uma forma da matéria e, no processo, fazer nascer algo intuitivo.
É nesse momento que entra em cena sua atração pela obra do uruguaio Torres-Garcia. Sala especial da última Bienal de São Paulo e futura retrospectiva do MAM, Torres-Garcia foi mestre incontestável da arte de humanizar a abstração. Ele provou que a arte abstrata não precisava ser fria. Podia ser intuitiva, afetiva, até.
Martins segue essa linha. Sua série de esculturas feitas em tijolo é a melhor tradução de tal pensamento. Para produzi-la o artista se meteu numa olaria, aprendeu a fabricar tijolo mole do barro e, com fios de arame, começou a praticar seus cortes, arrancando a matéria do barro. As formas resultantes são apenas intuições fabricadas pela energia do ato.

Exposição: Alberto Alexandre Martins
Onde: Espaço Higienópolis (rua Teresópolis, 90 - tel. 011/867-4077)
Quando: de 10 de abril a 26 de maio

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