São Paulo, quarta-feira, 10 de abril de 1996
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Preso se afeiçoa a refém

WILLIAM FRANÇA
ENVIADO ESPECIAL A APARECIDA DE GOIÂNIA (GO)

"Olha, eu sinto ter conhecido o senhor em uma situação como esta, mas foi um grande prazer conhecer uma pessoa tão formidável como o senhor. O nosso Brasil tem poucas pessoas como você. Eu senti um amigo em você. Quero que se lembre sempre de mim."
O texto acima é de um bilhete escrito pelo fugitivo Célio Antônio de Souza, o "Goiatuba", e foi entregue a Antônio Lorenzo Filho, secretário de Segurança Pública de Goiás.
"Goiatuba" era um dos fugitivos do Cepaigo -foi morto logo depois de repassar o bilhete-, e Lorenzo, um dos reféns usados durante a fuga.
O bilhete mostra um lado inusitado da rebelião do Cepaigo, que produziu uma síndrome de Estocolmo ao contrário.
A síndrome, verificada durante um sequestro na Suécia, surge quando um refém passa a admirar o sequestrador e chega até a se apaixonar.
Na rebelião do Cepaigo há vários exemplos dessa síndrome, como os do presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Homero Sabino, do seu filho Aldo e do ex-diretor do presídio, Nicola Limongi.
Todos eles afirmaram que devem o fato de hoje estar vivos ao assaltante e sequestrador Leonardo Pareja.
O próprio Pareja citou a síndrome. O curioso é que, nesse caso, a longa convivência levou os presos a se considerar amigos dos reféns, admirando-os.
Além do bilhete de "Goiatuba", há mais exemplos, como quando os 43 presos que iriam fugir tiveram de ser divididos em oito carros -com apenas seis reféns.
"Todo mundo queria levar o desembargador. Para não dar mais confusão, a gente colocou todo mundo no pátio, colocou os reféns nos carros e mandou cada grupo entrar neles. Só os líderes escolheram quem levava", disse à Folha Oney Severino da Silva, o "Chulé" -o preso que iniciou a rebelião.
"Os presos que fugiram sem reféns era tudo desmiolado. Deles a gente não tinha a garantia de que não iam machucar os reféns", disse "Chulé".
O desembargador foi levado no carro em que estava César Augusto de Freitas, o Cezinha, que não abriu mão do seu refém na hora da fuga.
"Ele dizia que daria a vida dele para me proteger. Ele me chamava de 'o pai que não tive"', afirma Homero Sabino.
Sabino ajudou Cezinha duas vezes durante crises de tuberculose e agora intercede para que ele seja levado a um hospital para tratamento.

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