São Paulo, sexta-feira, 12 de abril de 1996
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Agricultura nova, políticos velhos

MAILSON DA NÓBREGA

Na Semana Santa, os jornais penam para descobrir assunto. São quatro dias sem notícias de Brasília, do mercado financeiro, da inflação, das vendas e do emprego, as campeãs de pautas e textos.
Desta vez, dois temas preencheram o habitual deserto de acontecimentos nesse período: a fuga do presídio de Aparecida de Goiânia e o atabalhoado aumento dos combustíveis.
Duas matérias que chamaram pouco a atenção tinham a ver, entretanto, com um forte embate entre o novo e o velho, que se trava no contexto das transformações sociais e culturais em curso no Brasil.
A Folha apareceu com o novo no sábado. Sem destaque, noticiou que o governo se prepara para oferecer opções de vendas nos mercados futuros de produtos agrícolas.
Será um passo importante para modernizar a comercialização agrícola, reduzir a corrupção e o desperdício, emitir sinais para o agribusiness e aposentar a velhíssima política de preços mínimos, de resto sob revisão em todo o mundo.
No mesmo dia, "O Globo" mostrou o velho. O deputado Valdir Collato (PMDB-SC), da bancada ruralista, apresentou cinco emendas à medida provisória da capitalização do Banco do Brasil, incluindo um limite de 12% ao ano para os juros.
Prevaleceu, nas emendas, a visão corporativista da política agrícola, em contraste com os ventos de modernização que sopram nos ministérios da Fazenda e da Agricultura.
Felizmente, bolsões de atraso costumam sucumbir à força das idéias novas. No caso da política agrícola, dois fatos conspiram contra o velho.
Primeiro, o desenvolvimento das telecomunicações e da informática, que acelerou a globalização do sistema financeiro. Mercados sofisticados têm substituído, com vantagens, a sustentação oficial de preços e os subsídios agrícolas.
Segundo, a crise fiscal, que atingiu ricos e pobres a partir da década de 70. Ficou inviável manter todos os esquemas de apoio oficial à agricultura, embora muitos deles ainda estejam sendo praticados.
São exemplos os estoques agrícolas da União Européia -que se mantêm altos apesar da resistência dos britânicos à política agrícola comum- e a entrega de milho subsidiado à indústria avícola dos EUA pela Commodity Credit Corporation.
É pouco provável, todavia, que esses mecanismos sobrevivam. Tem sido crescente a percepção de seu custo para o contribuinte e da possibilidade de o mercado substituir eficientemente o Estado em ações de interesse da agricultura.
No Brasil, choca a tentativa de ressuscitar políticas pregressas de preços e crédito na área rural, que morreram na prática em meio à crise das finanças federais.
Certos políticos têm-se mostrado incapazes de entender as mudanças e não se dão conta de que seus métodos caminham para o túmulo.
No passado, eles atuavam à sombra, exercendo sua pressão nos gabinetes da Esplanada dos Ministérios e nos corredores dos bancos oficiais.
Com a democratização e as reformas orçamentárias, tiveram de agir às claras. No Congresso, sua atuação é seguida e analisada. Nada escapa ao monitoramento da imprensa, ao trabalho dos estudiosos e ao ataque de seus adversários.
É o caso do recente estudo da bancada ruralista, efetuado por Cláudio Gonçalves Couto, do Departamento de Política da PUC de São Paulo ("As bancadas partidárias no Congresso", 1995, mimeo).
Trata-se de interessante estudo sobre as bancadas no Congresso e sobre a inibição que causam à institucionalização e ao fortalecimento dos partidos políticos.
Couto sustenta que o parlamentar adere à bancada ruralista "não porque é ruralista na atividade extrapolítica, mas porque apoiar as demandas dos ruralistas representa uma forma de obter forte apoio eleitoral", o que inclui "a possibilidade de obter junto ao setor agrícola financiamento para as campanhas".
A desvantagem da bancada ruralista é que as idéias vencedoras tendem a triunfar, mesmo nos mais reacionários territórios. Ela deverá ser perdedora à medida que o país evoluir para melhor.

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