São Paulo, sexta-feira, 12 de abril de 1996
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A lógica do autoritarismo

JOSÉ DIRCEU

Não se trata de conspiração ou maniqueísmo. Mas, sem dúvida, o presidente Fernando Henrique move-se, sem pudor, no terreno do autoritarismo.
E não é porque FHC deixou de ser democrata e decidiu embriagar-se pelo poder. Mas, sim, pelo modelo econômico do governo ser mantido por uma lógica autoritária.
A política econômica em vigor leva ao fechamento político, à negação da oposição e à desmobilização das organizações sociais.
O atual modelo submete o país às influências internacionais e depende de investimentos voláteis -que fugirão ao primeiro sinal de instabilidade. Por isso a condição para o governo manter seus compromissos com a comunidade econômica é calar adversários e convencer investidores de que está garantido o continuísmo da política econômica.
Para o ajuste econômico pretendido pelos neoliberais é preciso não só mudar a Constituição como centralizar o poder. Daí a escalada de centralismo administrativo e truculência fiscal do governo. A proposta de reforma tributária, junto com o Fundo de Estabilização Financeira (o antigo FSE), são a negação do Congresso e do Orçamento.
Essas medidas, mais as propostas na reforma administrativa, anulam a Federação e a autonomia dos Estados e municípios. O Brasil vive um processo de autoritarismo civil.
Impedir mudanças alimenta a lógica do autoritarismo de FHC. Essa a razão que o levou a reprimir com violência -e tanques- a greve dos petroleiros e o estimula a vetar a anistia aos sindicatos multados pela Justiça do Trabalho.
Tudo para impor o modelo econômico que agora quer "flexibilizar" a relação capital/trabalho. A lógica do governo nega o princípio da existência de oposição e procura deslegitimizar qualquer movimento social.
A cada dia há mais sinais nesse sentido. A relação de FHC com o Parlamento não deixa dúvidas. Primeiro as palavras de descrédito proferidas em recente viagem ao México. Em seguida a hospitalidade a Fujimori.
Recentemente lançou-se explicitamente à compra de parlamentares fisiológicos, ao mesmo tempo em que não mede elogios públicos ao Parlamento.
Agora patrocina mudanças no regimento da Câmara para acabar com o legítimo direito de apresentar destaques e instiga a opinião pública contra o Parlamento. Isso para não citar as vulgaridades proferidas pelo ministro Sérgio Motta, paladino da virilidade presidencial. Não se enganem.
O caminho para o autoritarismo parece não ter limites. Com ameaças de demissão e repressão branca, o governo FHC instalou um regime de terror nas repartições públicas, particularmente no Banco Central. Quer convencer o servidor a não cumprir a lei, denunciando ilegalidades de seu conhecimento. Mais grave é a ação oficial de manter sucateada a Polícia Federal e silenciar o Ministério Público, paralisando inquéritos de corrupção.
A defesa da reeleição é outra manifestação dessa mesma lógica. Os aliados de FHC dizem que essa tese é boa para a nação. E quem achar o contrário é impatriótico.
Nesse ritmo, amanhã FHC pode dizer que precisa fechar o Congresso. Discursará, altivo, alegando que foi obrigado a fazer acordos fisiológicos nocivos à sociedade para garantir a "estabilidade". Tanto FHC quanto Sérgio Motta já falam em "caos" -discurso preferido dos ditadores.
Essa lógica de autoritarismo precisa ser contestada. A defesa da legitimidade e do exercício da oposição é compromisso prioritário dos que desejam a consolidação da democracia.
Os instrumentos para isso passam pela construção de uma ampla política de alianças na sociedade, pela luta social, pelo fortalecimento das entidades representativas e pela independência da Procuradoria Geral da República e dos Poderes Judiciário e Legislativo.
Essas são tarefas para aqueles que se colocam hoje contra o autoritarismo crescente da aliança PFL/PSDB.
A sociedade civil e os democratas precisam reagir já.

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